terça-feira, 10 de abril de 2012

MANUEL BANDEIRA




Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho nasceu no Recife no dia 19 de abril de 1886, na Rua da Ventura, atual Joaquim Nabuco, filho de Manuel Carneiro de Souza Bandeira e Francelina Ribeiro de Souza Bandeira. Em 1890 a família se transfere para o Rio de Janeiro e a seguir para Santos - SP e, novamente, para o Rio de Janeiro. Passa dois verões em Petrópolis.
Em 1892 a família volta para Pernambuco. Manuel Bandeira freqüenta o colégio das irmãs Barros Barreto, na Rua da Soledade, e, como semi-interno, o de Virgínio Marques Carneiro Leão, na Rua da Matriz.
A família mais uma vez se muda do Recife para o Rio de Janeiro, em 1896, onde reside na Travessa Piauí, na Rua Senador Furtado e depois em Laranjeiras.Bandeira cursa o Externato do Ginásio Nacional (atual Colégio Pedro II). Tem como professores Silva Ramos, Carlos França, José Veríssimo e João Ribeiro. Entre seus colegas estão Sousa da Silveira e Antenor Nascentes.
Em 1903 a família se muda para São Paulo onde Bandeira se matricula na Escola Politécnica, pretendendo tornar-se arquiteto. Estuda também, à noite, desenho e pintura com o arquiteto Domenico Rossi no Liceu de Artes e Ofícios. Começa ainda a trabalhar nos escritórios da Estrada de Ferro Sorocabana, da qual seu pai era funcionário.
No final do ano de 1904, o autor fica sabendo que está tuberculoso, abandona suas atividades e volta para o Rio de Janeiro. Em busca de melhores climas para sua saúde, passa temporadas em diversas cidades: Campanha, Teresópolis, Maranguape, Uruquê, Quixeramobim.
"... - O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.

- Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?

- Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino."
Em 1910 entra em um concurso de poesia da Academia Brasileira de Letras, que não confere o prêmio. Lê Charles de Guérin e toma conhecimento das rimas toantes que empregaria em Carnaval.
Sob a influência de Apollinaire, Charles Cros e Mac-Fionna Leod, escreve seus primeiros versos livres,em 1912.
A fim de se tratar no Sanatório de Clavadel, na Suíça, embarca em junho de 1913 para a Europa. No mesmo navio viajam Mme. Blank e suas duas filhas. No sanatório conhece Paul Eugène Grindel, que mais tarde adotaria o pseudônimo de Paul Éluard, e Gala, que se casaria com Éluard e depois com Salvador Dali.
Em virtude da eclosão da Primeira Guerra Mundial, em 1914, volta ao Brasil em outubro. Lê Goethe, Lenau e Heine (no sanatório reaprendera o alemão que havia estudado no ginásio). No Rio de Janeiro, reside na rua Nossa Senhora de Copacabana e na Rua Goulart.
Em 1916 falece sua mãe, Francelina. No ano seguinte publica seu primeiro livro:A cinza das horas, numa edição de 200 exemplares custeada pelo autor. João Ribeiro escreve um artigo elogioso sobre o livro. Por causa de um hiato num verso do poeta mineiro Mário Mendes Campos, Manuel Bandeira desenvolve com o crítico Machado Sobrinho uma polêmica nas páginas do Correio de Minas, de Juiz de Fora.
O autor perde a irmã, Maria Cândida de Souza Bandeira, que desde o início da doença do irmão, havia sido uma dedicada enfermeira, em 1918. No ano seguinte publica seu segundo livro, Carnaval, em edição custeada pelo autor. João Ribeiro elogia também este livro que desperta entusiasmo entre os paulistas iniciadores do modernismo.
O pai de Bandeira, Manuel Carneiro, falece em 1920. O poeta se muda da Rua do Triunfo, em Paula Matos, para a Rua Curvelo, 53 (hoje Dias de Barros), tornando-se vizinho de Ribeiro Couto. Numa reunião na casa de Ronald de Carvalho, em Copacabana, no ano de 1921, conhece Mário de Andrade. Estavam presentes, entre outros, Oswald de Andrade, Sérgio Buarque de Holanda e Osvaldo Orico.
Inicia então, em 1922, a se corresponder com Mário de Andrade.  Bandeiranão participa da Semana de Arte Moderna, realizada em fevereiro em são Paulo, no Teatro Municipal. Na ocasião, porém, Ronald de Carvalho lê o poema "Os Sapos", de "Carnaval". Meses depois Bandeira vai a São Paulo e conhece Paulo Prado, Couto de Barros, Tácito de Almeida, Menotti del Picchia, Luís Aranha, Rubens Borba de Morais, Yan de Almeida Prado. No Rio de Janeiro, passa a conviver com Jaime Ovalle, Rodrigo Melo Franco de Andrade, Prudente de Morais, neto, Dante Milano. Colabora em Klaxon. Ainda nesse ano morre seu irmão, Antônio Ribeiro de Souza Bandeira.
Em 1924 publica, às suas expensas, Poesias, que reúne A Cinza das Horas, Carnaval e um novo livro, O Ritmo Dissoluto. Colabora no "Mês Modernista", série de trabalhos de modernistas publicado pelo jornal A Noite, em 1925. Escreve crítica musical para a revista A Idéia Ilustrada. Escreve também sobre música para Ariel, de São Paulo.
A serviço de uma empresa jornalística, em 1926 viaja para Pouso Alto, Minas Gerais, onde na casa de Ribeiro Couto conhece Carlos Drummond de Andrade. Viaja a Salvador, Recife, Paraíba (atual João Pessoa), Fortaleza, São Luís e Belém. No ano seguinte continua viajando: vai a Belo Horizonte, passando pelas cidades históricas de Minas Gerais, e a São Paulo. Viaja a Recife, como fiscal de bancas examinadoras de preparatórios. Inicia uma colaboração semanal de crônicas no Diário Nacional, de São Paulo, e em A Província, de Recife, dirigido por Gilberto Freyre. Colabora na Revista de Antropofagia.
1930 marca a publicação de Libertinagem, em edição como sempre custeada pelo autor. Muda-se, em 1933, da Rua do Curvelo para a Rua Morais e Vale, na Lapa. É nomeado, no ano de 1935, pelo Ministro Gustavo Capanema, inspetor de ensino secundário.
Grandes comemorações marcam os cinqüenta anos do poeta, em 1936, entre as quais a publicação de Homenagem a Manuel Bandeira, livro com poemas, estudos críticos e comentários, de autoria dos principais escritores brasileiros. Publica Estrela da Manhã (com papel presenteado por Luís Camilo de Oliveira Neto e contribuição de subscritores) e Crônicas da Província do Brasil.
Recebe o prêmio da Sociedade Filipe de Oliveira por conjunto de obra, em 1937, e publica Poesias Escolhidas Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Romântica.
No ano seguinte é nomeado professor de literatura do Colégio Pedro II e membro do Conselho Consultivo do Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Publica Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Parnasianae Guia de Ouro Preto.
Em 1940 é eleito para a Academia Brasileira de Letras, na vaga de Luís Guimarães Filho. Toma posse em 30 de novembro, sendo saudado por Ribeiro Couto. Publica Poesias Completas, com a inclusão da Lira dos Cinqüent'Anos(também esta edição foi custeada pelo autor). Publica ainda Noções de História das Literaturas e, em separata da Revista do BrasilA Autoria das Cartas Chilenas.
Começa a fazer crítica de artes plásticas em A Manhã, em 1941, no Rio de Janeiro. No ano seguinte é nomeado membro da Sociedade Filipe de Oliveira. Muda-se para o Edifício Maximus, na Praia do Flamengo. Organiza a edição dos Sonetos Completos e Poemas Escolhidos de Antero de Quental.
Nomeado professor de literatura hispano-americana da Faculdade Nacional de Filosofia, em 1943, deixa o Colégio Pedro II. Muda-se, em 1944, para o Edifício São Miguel, na Avenida Beira-Mar, apartamento 409. Publica Obras Poéticas de Gonçalves Dias, edição crítica e comentada. No ano seguinte publica Poemas Traduzidos, com ilustrações de Guignard.
Recebe o prêmio de poesia do IBEC por conjunto de obra, em 1946. PublicaApresentação da Poesia Brasileira e Antologia dos Poetas Brasileiros Bissextos Contemporâneos.
Em 1948 são reeditados três de seus livros: Poesias Completas, com acréscimo de Belo Belo; Poesias Escolhidas Poemas Traduzidos. Publica Mafuá do Malungo (impresso em Barcelona por João Cabral de Melo Neto) e organiza uma edição crítica das Rimas de João Albano. No ano seguinte publica Literatura Hispano-Americana e traduz O Auto Sacramental do Divino Narciso de Sóror Juana Inés de la Cruz.
A pedido de amigos, apenas para compor a chapa, candidata-se a deputado pelo Partido Socialista Brasileiro, em 1950, sabendo que não tem quaisquer chances de eleger-se. No ano seguinte publica Opus 10 e a biografia deGonçalves Dias. É operado de cálculos no ureter.  Muda-se, em 1953, para o apartamento 806 do mesmo edifício da Avenida Beira-Mar.
No ano de 1954 publica Itinerário de Pasárgada De Poetas e de Poesia. Faz conferência no Teatro Municipal do Rio de Janeiro sobre Mário de Andrade. Publica 50 Poemas Escolhidos pelo Autor, em 1955. Traduz Maria Stuart, de Schiler, encenado no Rio de Janeiro e em São Paulo. Em junho, inicia colaboração como cronista no Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro, e na Folha da Manhã, de São Paulo. Faz conferência sobre Francisco Mignone no Teatro Municipal do Rio de Janeiro.
Traduz Macbeth, de Shakespeare, e La Machine Infernale, de Jean Cocteau, em 1956. É aposentado compulsoriamente, por motivos da idade, como professor de literatura hispano-americana da Faculdade Nacional de Filosofia.
Traduz as peças Juno and the Paycock, de Sean O'Casey, e The Rainmaker,de N. Richard Nash, em 1957. Nesse ano, publica Flauta de Papel. Em julho visita para a Europa, visitando Londres, Paris, e algumas cidades da Holanda. Retorna ao Brasil em novembro. Escreve, até 1961, crônicas bissemanais para o Jornal do Brasil e a Folha de São Paulo.
Em 1958, publica Gonçalves Dias, na coleção "Nossos Clássicos" da Editora Agir. Traduz a peça Colóquio-Sinfonieta, de Jean Tardieu. Publicada pela Aguilar, sai em dois volumes sua obra completa -- Poesia e Prosa.
No ano seguinte traduz The Matchmaker (A Casamenteira), de Thorton Wilder. A Sociedade dos Cem Bibliófilos publica Pasárgada, volume de poemas escolhidos, com ilustrações de Aldemir Martins.
Em 1960 traduz o drama D. Juan Tenório, de Zorrilla. Pela Editora Dinamene, da Bahia, saem em edição artesanal Estrela da Tarde e uma seleção de poemas de amor intitulada Alumbramentos. Sai na França, pela Pierre Seghers,Poèmes, antologia de poemas de Manuel Bandeira em tradução de Luís Aníbal Falcão, F. H. Blank-Simon e do próprio autor.
No ano seguinte traduz Mireille, de Fréderic Mistral. Começa a escrever crônicas semanais para o programa "Quadrante" da Rádio Ministério da Educação. Em 1962 traduz o poema Prometeu e Epimeteu de Carl Spitteler.
Escreve para a Editora El Ateneo, em 1963, biografias de Gonçalves Dias, Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Junqueira Freire e Castro Alves. A Editora das Américas edita Poesia e Vida de Gonçalves Dias. Traduz a peça Der Kaukasische Kreide Kreis, de Bertold Brecht. Escreve crônicas para o programa "Vozes da Cidade" da Rádio Roquette-Pinto, algumas das quais lidas por ele próprio, com o título "Grandes Poetas do Brasil".
Traduz as peças O Advogado do Diabo, de Morris West, e Pena Ela Ser o Que É, de John Ford. Sai nos EUA, pela Charles Frank Publications, A Brief History of Brazilian Literature (tradução, introdução e notas de R. E. Dimmick), em 1964.
No ano de 1965 traduz as peças Os Verdes Campos do Eden, de Antonio Gala. A Fogueira Feliz, de J. N.Descalzo, e Edith Stein na Câmara de Gás de Frei Gabriel Cacho. Sai na França, pela Pierre Seghers, na coleção "Poètes d'Aujourd'hui", o volume Manuel Bandeira, com estudo, seleção de textos, tradução e bibliografia por Michel Simon.
Comemora 80 anos, em 1966, recebendo muitas homenagens. A Editora José Olympio realiza em sua sede uma festa de que participam mais de mil pessoas e lança os volumes Estrela da Vida Inteira (poesias completas e traduções de poesia) e Andorinha Andorinha (seleção de textos em prosa, organizada por Carlos Drummond de Andrade). Compra uma casa em Teresópolis, a única de sua propriedade ao longo de toda sua vida.
Com problemas de saúde, Manuel Bandeira deixa seu apartamento da Avenida Beira-Mar e se transfere para o apartamento da Rua Aires Saldanha, em Copacabana, de Maria de Lourdes Heitor de Souza, sua companheira dos últimos anos.
No dia 13 de outubro de 1968, às 12 horas e 50 minutos, morre o poetaManuel Bandeira, no Hospital Samaritano, em Botafogo, sendo sepultado no Mausoléu da Academia Brasileira de Letras, no Cemitério São João Batista.

Bibliografia
:
Poesia:
- A Cinza das Horas - Jornal do Comércio - Rio de Janeiro, 1917 (Edição do Autor)
- Carnaval - Rio de janeiro,1919 (Edição do Autor)
- Poesias (acrescida de O Ritmo Dissoluto) - Rio de Janeiro, 1924
- Libertinagem - Rio de Janeiro, 1930 (Edição do Autor)
- Estrela da Manhã - Rio de Janeiro, 1936 (Edição do Autor)
- Poesias Escolhidas - Rio de Janeiro, 1937
- Poesias Completas acrescida de Lira dos cinqüent'anos) - Rio de Janeiro, 1940 (Edição do Autor)
- Poemas Traduzidos - Rio de Janeiro, 1945
- Mafuá do Malungo - Barcelona, 1948 (Editor João Cabral de Melo Neto)
- Poesias Completas (com Belo Belo) - Rio de Janeiro, 1948
- Opus 10 - Niterói - 1952
- 50 Poemas Escolhidos pelo Autor - Rio de Janeiro, 1955
- Poesias completas (acrescidas de Opus 10) - Rio de Janeiro, 1955
- Poesia e prosa completa (acrescida de Estrela da Tarde), Rio de Janeiro, 1958
- Alumbramentos - Rio de Janeiro, 1960
- Estrela da Tarde - Rio de Janeiro, 1960
- Estrela a vida inteira, Rio de Janeiro, 1966 (edição em homenagem aos 80 anos do poeta).
- Manuel Bandeira - 50 poemas escolhidos pelo autor - Rio de Janeiro, 2006.
Prosa:
- Crônicas da Província do Brasil - Rio de Janeiro, 1936
- Guia de Ouro Preto, Rio de Janeiro, 1938
- Noções de História das Literaturas - Rio de Janeiro, 1940
- Autoria das Cartas Chilenas - Rio de Janeiro, 1940
- Apresentação da Poesia Brasileira - Rio de Janeiro, 1946
- Literatura Hispano-Americana - Rio de Janeiro, 1949
- Gonçalves Dias, Biografia - Rio de Janeiro, 1952
- Itinerário de Pasárgada - Jornal de Letras, Rio de Janeiro, 1954
- De Poetas e de Poesia - Rio de Janeiro, 1954
- A Flauta de Papel - Rio de Janeiro, 1957
- Itinerário de Pasárgada - Livraria São José - Rio de Janeiro, 1957
- Prosa - Rio de Janeiro, 1958
- Andorinha, Andorinha - José Olympio - Rio de Janeiro, 1966
- Itinerário de Pasárgada - Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1966
- Colóquio Unilateralmente Sentimental - Editora Record - RJ, 1968
- Seleta de Prosa - Nova Fronteira - RJ
- Berimbau e Outros Poemas - Nova Fronteira - RJ
Antologias:
- Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Romântica, N. Fronteira,  RJ
- Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Parnasiana - N. Fronteira, RJ
- Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Moderna - Vol. 1, N. Fronteira, RJ
- Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Moderna - Vol. 2, N. Fronteira, RJ
- Antologia dos Poetas Brasileiros Bissextos Contemporâneos, N. Fronteira, RJ
- Antologia dos Poetas Brasileiros - Poesia Simbolista, N. Fronteira, RJ
- Antologia Poética - Editora do Autor, Rio de Janeiro, 1961
- Poesia do Brasil - Editora do Autor, Rio de Janeiro, 1963
- Os Reis Vagabundos e mais 50 crônicas - Editora do Autor, RJ, 1966
- Manuel Bandeira - Poesia Completa e Prosa, Ed. Nova Aguilar,  RJ
- Antologia Poética (nova edição), Editora N. Fronteira, 2001
Em conjunto:

Quadrante 1 - Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1962
  (com Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Dinah Silveira
  de Queiroz, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos e Rubem Braga)

- Quadrante 2 - Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1963
  (com Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Dinah Silveira
  de Queiroz, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos e Rubem Braga)

- Quatro Vozes - Editora Record - Rio de Janeiro, 1998
  (com Carlos Drummond de Andrade, Rachel de Queiroz e Cecília
  Meireles)

- Elenco de Cronistas Modernos - Ed. José Olympio - RJ
  (com Carlos Drummond de Andrade, Rubem Braga

- O Melhor da Poesia Brasileira 1 - Ed. José Olympio - Rio de Janeiro
  (com Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Melo Neto)

- Os Melhores Poemas de Manuel Bandeira (seleção de Francisco de
  A. Barbosa) - Editora Global - Rio de Janeiro)
Seleção e Organização:
- Sonetos Completos e Poemas Escolhidos de Antero de Quental
- Obras Poéticas de Gonçalves Dias, 1944
- Rimas de José Albano, 1948
- Cartas a Manuel Bandeira, de Mário de Andrade, 1958
Multimídia:
- CD "Manuel Bandeira: O Poeta de Botafogo" - Gravações inéditas feitas pelo poeta e por Lauro Moreira, tendo como fundo musical peças de Camargo Guarnieri interpretadas pelo pianista Belkiss Carneiro Mendonça, 2005.

Fonte: releituras.com



ARTE DE AMAR

Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus - ou fora do mundo.
As almas são incomunicáveis.
Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
Porque os corpos se entendem, mas as almas não.



A Cópula

Depois de lhe beijar meticulosamente 
o cu, que é uma pimenta, a boceta, que é um doce, 
o moço exibe à moça a bagagem que trouxe: 
culhões e membro, um membro enorme e turgescente. 

Ela toma-o na boca e morde-o. Incontinenti, 
Não pode ele conter-se, e, de um jacto, esporrou-se. 
Não desarmou porém. Antes, mais rijo, alteou-se 
E fodeu-a. Ela geme, ela peida, ela sente 

Que vai morrer: - "Eu morro! Ai, não queres que eu morra?!" 
Grita para o rapaz que aceso como um diabo, 
arde em cio e tesão na amorosa gangorra 

E titilando-a nos mamilos e no rabo 
(que depois irá ter sua ração de porra), 
lhe enfia cona adentro o mangalho até o cabo.


Tempo Será:

A Eternidade está longe
(Menos longe que o estirão
Que existe entre o meu desejo
E a palma da minha mão).

Um dia serei feliz?
Sim, mas não há de ser já:
A Eternidade está longe,
Brinca de tempo-será.



Quero a delicia de poder sentir as coisas mais simples



O BICHO

VI ONTEM um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.




"Beijo pouco, falo menos ainda.
Mas invento palavras
Que traduzem a ternura mais funda
E mais cotidiana.
Inventei, por exemplo, o verbo teadorar.
Intransitivo:
Teadoro, Teodora.

Petrópolis 25/2/1947



POÉTICA 


Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto espediente protocolo e manifestações de apreço ao sr. diretor.

Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo.

Abaixo os puristas.
Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis

Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo.

De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes maneiras de agradar &agraves mulheres, etc.

Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbados
O lirismo dos clowns de Shakespeare.

- Não quero saber do lirismo que não é libertação.


A Morte Absoluta
Morrer.
Morrer de corpo e de alma.
Completamente.


Morrer sem deixar o triste despojo da carne,
A exangue máscara de cera,
Cercada de flores,
Que apodrecerão - felizes! - num dia,
Banhada de lágrimas
Nascidas menos da saudade do que do espanto da morte.


Morrer sem deixar porventura uma alma errante...
A caminho do céu?
Mas que céu pode satisfazer teu sonho de céu?


Morrer sem deixar um sulco, um risco, uma sombra,
A lembrança de uma sombra
Em nenhum coração, em nenhum pensamento,
Em nenhuma epiderme.


Morrer tão completamente
Que um dia ao lerem o teu nome num papel
Perguntem: "Quem foi?..."


Morrer mais completamente ainda,
- Sem deixar sequer esse nome.

Mulheres

Como as mulheres são lindas!
Inútil pensar que é do vestido...
E depois não há só as bonitas:
Há também as simpáticas.
E as feias, certas feias em cujos olhos vejo isto:
Uma menininha que é batida e pisada e nunca sai da cozinha.

Como deve ser bom gostar de uma feia!
O meu amor porém não tem bondade alguma.
É fraco! Fraco!
Meu Deus, eu amo como as criancinhas...

És linda como uma história da carochinha...
E eu preciso de ti como precisava de mamãe e papai
(No tempo em que pensava que os ladrões moravam no morro atrás de casa e tinham cara de pau)





Nas ondas da praia
Nas ondas do mar
Quero ser feliz
Quero me afogar.

Nas ondas da praia
Quem vem me beijar?
Quero a estrela-d'alva
Rainha do mar.

Quero ser feliz
Nas ondas do mar
Quero esquecer tudo
Quero descansar.

(Estrela da Manhã)





Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte?
— O que eu vejo é o beco.





Aceitar o castigo imerecido
não por fraqueza, mas por altivez.
no tormento mais fundo o teu gemido 
trocar num grito de ódio a que o fez.
As delícias da carne e pensamento
com que o instinto da espécie nos engana,
sobpor ao generoso sentimento
de uma afeição mais simplesmente humana.
Não tremer de esperança e nem de espanto.
Nada pedir nem desejar senão a coragem
De ser um novo santo. sem fé num mundo além do mundo.
E então morrer sem uma lágrima que a vida 
Não vale a pena e a dor de ser vivida.





Namorados

O rapaz chegou-se para junto da moça e disse:
-Antônia, ainda não me acostumei com o seu corpo, com sua cara.
A moça olhou de lado e esperou.
-Você não sabe quando a gente é criança e de repente vê uma lagarta listrada?
A moça se lembrava:
-A gente fica olhando...
A meninice brincou de novo nos olhos dela.
O rapaz prosseguiu com muita doçura:
-Antônia, você parece uma lagarta listrada.
A moça arregalou os olhos, fez exclamações.
O rapaz concluiu:
-Antônia, você é engraçada! Você parece louca.





"Não quero amar,
Não quero ser amado.
Não quero combater,
Não quero ser soldado.

— Quero a delícia de poder sentir as coisas mais simples!


Tu amarás outras mulheres
E tu me esquecerás!
É tão cruel, mas é a vida.
E no entretanto
Alguma coisa em ti pertence-me!
Em mim alguma coisa és tu.
O lado espiritual do nosso amor
Nos marcou para sempre.
Oh, vem em pensamento nos meus braços!
Que eu te afeiçoe e acaricie...

Não sei porque te falo assim de coisas que não são.
Esta noite, de súbito, um aperto
De coração tão vivo e lancinante
Tive ao pensar numa separação!
Não sei que tenho, tão ansiosa e sem motivo.
Queria ver-te... estar ao pé de ti...
Cruel volúpia e profunda ternura dilaceram-me!

É como uma corrida, em minhas veias,
De fúrias e de santas para a ponta dos meus dedos
Que queriam tomar tua cabeça amada,
Afagar tua fronte e teus cabelos,
Prender-te a mim por que jamais tu me escapasses!

Oh, quisera não ser tão voluptuosa!
E todavia
Quanta delícia ao nosso amor traz a volúpia!
Mas faz sofrer... inquieta...
Ah, com que poderei contentá-la jamais?
Quisera calmá-la na música...
Ouvir muito, ouvir muito...
Sinto-me terna... e sou cruel e melancólica!

Possui-me como sou na ampla noite pressaga!
Sente o inefável!
Guarda apenas a ventura
Do meu desejo ardendo a sós
Na treva imensa...
Ah, se eu ouvisse a tua voz!


MASCARADA
Você me conhece? 
(Frase dos mascarados de antigamente) 

- Você me conhece? 
- Não conheço não. 
- Ah, como fui bela! 
Tive grandes olhos, 
que a paixão dos homens 
(estranha paixão!) 
Fazia maiores... 
Fazia infinitos. 
Diz: não me conheces? 
- Não conheço não. 

- Se eu falava, um mundo 
Irreal se abria 
à tua visão! 
Tu não me escutavas: 
Perdido ficavas 
Na noite sem fundo 
Do que eu te dizia... 
Era a minha fala 
Canto e persuasão... 
Pois não me conheces? 
- Não conheço não. 
- Choraste em meus braços 
- Não me lembro não. 

- Por mim quantas vezes 
O sono perdeste 
E ciúmes atrozes 
Te despedaçaram! 

Por mim quantas vezes 
Quase tu mataste, 
Quase te mataste, 
Quase te mataram! 
Agora me fitas 
E não me conheces? 

- Não conheço não. 
Conheço que a vida 
É sonho, ilusão. 
Conheço que a vida, 
A vida é traição.


TU QUE ME DESTE O TEU CUIDADO... 

Tu que me deste o teu carinho 
E que me deste o teu cuidado, 
Acolhe ao peito, como o ninho 
Acolhe ao pássaro cansado, 
O meu desejo incontentado. 

Há longos anos ele arqueja 
Em aflitiva escuridão. 
Sê compassiva e benfazeja. 
Dá-lhe o melhor que ele deseja: 
Teu grave e meigo coração. 

Sê compassiva. Se algum dia 
Te vier do pobre agravo e mágoa, 
Atende à sua dor sombria: 
Perdoa o mal que desvaria 
E traz os olhos rasos de água. 

Não te retires ofendida. 
Pensa que nesse grito vem 
O mal de toda a sua vida: 
Ternura inquieta e malferida 
Que, antes, não dei nunca a ninguém. 

E foi melhor nunca ter dado: 
Em te pungido algum espinho, 
Cinge-a ao teu peito angustiado. 
E sentirás o meu carinho. 
E setirás o meu cuidado.


RENÚNCIA

Chora de manso e no íntimo... procura 
Tentar curtir sem queixa o mal que te crucia: 
O mundo é sem piedade e até riria 
Da tua inconsolável amargura. 

Só a dor enobrece e é grande e é pura. 
Aprende a amá-la que a amarás um dia. 
Então ela será tua alegria, 
E será ela só tua ventura... 

A vida é vã como a sombra que passa 
Sofre sereno e de alma sombranceira 
Sem um grito sequer tua desgraça. 

Encerra em ti tua tristeza inteira 
E pede humildemente a Deus que a faça 
Tua doce e constante companheira...


"O que eu adoro em ti 
Não é a tua beleza 
A beleza é em nós que existe 
A beleza é um conceito 
E a beleza é triste 
Não é triste em si 
Mas pelo que há nela 
De fragilidade e incerteza 

O que eu adoro em ti 
Não é a tua inteligência 
Não é o teu espírito sutil 
Tão ágil e tão luminoso 
Ave solta no céu matinal da montanha 
Nem é a tua ciência 
Do coração dos homens e das coisas. 

O que eu adoro em ti 
Não é a tua graça musical 
Sucessiva e renovada a cada momento 
Graça aérea como teu próprio momento 
Graça que perturba e que satisfaz 

O que eu adoro em ti 
Não é a mãe que já perdi 
E nem meu pai 

O que eu adoro em tua natureza 
Não é o profundo instinto matinal 
Em teu flanco aberto como uma ferida 
Nem a tua pureza. Nem a tua impureza. 

O que adoro em ti lastima-me e consola-me:
O que eu adoro em ti é a vida!


Não te retires ofendida.
Pensa que nesse grito vem
O mal de toda minha vida:
Ternura inquieta e malferida
Que, antes, não dei nunca a ninguém.

E foi melhor nunca ter dado:
Em te pungindo algum espinho
Cinge-a ao teu seio angustiado.
E sentirás o meu carinho


"Teresa, se algum sujeito
bancar o sentimental em cima de você
E te jurar uma paixão do tamanho de um bonde
Se ele chorar
Se ele se ajoelhar
Se ele se rasgar todo
Não acredita não Teresa
É lágrima de cinema
É tapeação
Mentira
CAI FORA."


Duas vezes se morre:
Primeiro na carne, depois no nome.
Os nomes, embora mais resistentes do que a carne, rendem-se ao poder destruidor do tempo, como as lápides.


Teresa

A primeira vez que vi Teresa 
Achei que ela tinha pernas estúpidas
Achei também que a cara parecia uma perna

Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse)

Da terceira vez não vi mais nada
Os céus se misturaram com a terra
E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas.



Belo belo minha bela 


Tenho tudo que não quero

Não tenho nada que quero

Não quero óculos nem tosse

Nem obrigação de voto

Quero quero

Quero a solidão dos píncaros

A água da fonte escondida

A rosa que floresceu

Sobre a escarpa inacessível

A luz da primeira estrela

Piscando no lusco-fusco

Quero quero

Quero dar a volta ao mundo

Só num navio de vela

Quero rever Pernambuco

Quero ver Bagdá e Cusco

Quero quero

Quero o moreno de Estela

Quero a brancura de Elisa

Quero a saliva de Bela

Quero as sardas de Adalgisa

Quero quero tanta coisa

Belo belo

Mas basta de lero-lero

Vida noves fora zero.


O dia vem, e dia a dentro 
Continuo a possuir o segredo da grande da noite.




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