quarta-feira, 2 de março de 2011

NIETZSCHE




Friedrich Nietzsche nasceu em 1844 na Alemanha numa cidade conhecida por Röcken. A sua família era luterana e o seu destino era ser pastor como seu pai. Nietzsche perde a fé durante a adolescência, e os estudos de filologia combatem com o que aprendeu sobre teológia: Durante os seus estudos na universidade de Leipzig, a sua vocação filosófica cresce. Foi um aluno brilhante, dotado de sólida formação clássica, e aos 25 anos é nomeado professor de Filologia na universidade de Basiléia.

Durante dez anos desenvolveu a sua filosófia em contacto com pensamento grego antigo. Em 1879 seu estado de saúde obriga-o a deixar de ser professor. Sua voz ficou inaudível. Começou uma vida errante em busca de um clima favorável tanto para sua saúde como para seu pensamento (Veneza, Gênova, Turim, Nice, Sils-Maria...) :

Em 1882, começa a escrever o Assim Falou Zaratustra. Nietzsche não cessa de escrever com um ritmo crescente. Este período termina brutalmente em 3 de Janeiro de 1889 com uma "crise de loucura" que, durou até à sua morte, coloca-o sob a tutela da sua mãe e sua irmã.

Estudos recentes atribuem a sua morte um cancro do cérebro, que eventualmente pode ter origem sifilítica. Sua irmã falseou seus escritos após a sua morte para apoiar uma causa anti-semita. Falácia, tendo em vista a repulsa de Nietzsche ao anti-semitismo em seus escritos.

O sucesso de Nietzsche, entretanto, sobreveio quando um professor dinamarquês leu a sua obra Assim Falou Zaratustra e, por conseguinte, tratou de difundi-la, em 1888. Muitos estudiosos da época tentaram localizar os momentos que Nietzsche escrevia sob crises nervosas ou sob efeito de drogas (Nietzsche estudou biologia e tentava descobrir sua própria maneira de minimizar os efeitos da sua doença).



"Jamais alguém fez algo totalmente para os outros. Todo amor é amor próprio. Pense naqueles que você ama: cave profundamente e verá que não ama à eles; ama as sensações agradáveis que esse amor produz em você! Você ama o desejo, não o desejado."






Nietzsche, a construção do Zaratustra


A quem Zaratustra procura


Nietzsche, profeta niilista




"O homem é corda distendida entre o animal e o super-homem: uma corda sobre um abismo; travessia perigosa, temerário caminhar, perigosos olhar para trás, perigoso tremer e parar." - Nietzsche "Assim falou Zaratustra", 1883


Meditando por dez anos numa caverna no alto de uma montanha, Zaratustra, apenas na companhia dos seus animais prediletos, a águia e a serpente, determinou-se baixar à planície. Decidira-se depois daqueles anos de rigor eremita vir comunicar aos homens a chegada de um novo messias, o Übermensch - o super-homem, o que dominará o futuro. Assim feito, Zaratustra enumera a quem sua mensagem se dirige:


Os eleitos por Zaratustra


- os que vivem intensamente, que são indiferentes aos perigos (welche nicht zu lebem wissen) porque são capazes de atravessar de um lado para outro;


- os grandes desdenhosos (der grossen Verachtenden), porque estão sempre tentando chegar a outra margem;


- aos que se sacrificam pela terra (die sich der Erde opfen);


- o curioso, o que quer conhecer (welcher erkennen will);


- quem trabalha e realiza invenções engenhosas (welcher arbeiter und erfinder);


- o que preza a sua própria virtude (sein Tugen liebt);


- aquele que distribui o seu espirito entre os demais (ganz der Geist seiner Tugend sein will);


- o que deseja viver e deixar viver (willen noch leben und nicht mehr leben);


- quem não seja exageradamente virtuosos, nem excessivamente moralista (welcher nicht zu viele Tugenden haben will);


- aquele que não fica a espera de agradecimentos ou recompensas (der nicht Dank haben will);


- o que não trapaceia (ein falscher Spieler);


- o que se orgulha dos seus feitos (welcher goldne Worte seine Taten vorauswirft);


- o combatente do presente (den Gegenwärtigen zugrunde gehen);


- o que desafia e fustiga o seu Deus (welcher seinen Gott züchtig);


- o de alma profunda (dessen Seele tief);


- o de alma trasbordante, que esquece de si mesmo (sich selber vergisst);


- quem tem o espirito e o coração livres (der freien Geistes und freie Herzen ist);


- os vaticinadores, os que prenunciam o relâmpago próximo (dass der Blitz kommt, und gehn als Verkündiger zugrunde), um relâmpago que se chama super-homem (Übermensch).


Porque Zaratustra?


Zaratustra, fundador do zoroastrismo




Zaratustra ou Zoroastro, fundador da religião persa, foi um profeta ariano que por volta de 600 a.C. pregou a existência do Bem e do Mal como entidades distintas e totalmente antagônicas (até então a crença geral era de que o mesmo deus era capaz de uma coisa, como a outra). É o autor dos Gäthäs, cinco hinos que formam a mais antiga e sagrada parte do Avesta, o livro santo do zoroastrismo. Nietzsche tomou conhecimento dele provavelmente por intermédio da obra de um erudito da época, inspirando-se então naquela fantástica personalidade.


O motivo de um ateu assumido como Nietzsche ter lançado mão de um carismático líder religioso do passado, fazendo-o veículo da sua mensagem, deve-se a que o pensador alemão racionalmente e intelectualmente deixara de ser cristão, mas psicologicamente e emocionalmente ainda seguiu tendo a mente de um crente. Afinal, Nietzsche era filho de um pastor luterano. O que igualmente explica o tom de sermão da sua prosa, carregada de parábolas, simbolismos e imagens litúrgicas e locais sagrados, presentes na maioria dos capítulos do "Assim falou Zaratustra". A escolha também tratou-se de uma provocação, pois o Zaratustra ficcional dele retornou a cena exatamente para desfazer o que o real profeta ariano fizera há mais de dois mil e quinhentos anos passados, isto é, instituir a idéia do Bem e do Mal.


O Anticristo


Zaratustra é pois um Anticristo. Ele não veio do deserto como Jesus Cristo, mas sim desceu do alto da montanha, do fundo da caverna, como viu Platão os filósofos emergirem em busca do sol, em busca da vida. Não se dirige aos pobres, ao humildes, aos doentes, aos perdidos e aos fracos, muito menos lhes promete o Reino dos Céus. Seu público é outro. É o dos vencedores, dos afirmadores da vida, os que querem viver o aqui e o agora, tendo a Terra como seu único reino. Arenga aos que desprezam! Desceu à planície para anular o cristianismo.


A sua meta é atingir uma parte especifica da humanidade, os homens superiores (höheren Menschen), a quem Cristo ignorou. Zaratustra é sim um Cristo da elite, pois Nietzsche escreveu o evangelho do super-homem - o que anuncia um novo tempo, uma era em que Deus morreu (dass Gott tot ist!), na qual o Homem se apressa para assumir o poder na totalidade, na qual terá que arcar com as conseqüências morais e éticas de um mundo sem Deus.


Para tanto, ele, o super-homem, operará a transvaloração. Tudo o que o cristianismo estigmatizara - o orgulho, o egoísmo, a riqueza, a vontade de poder, a sensualidade e a nobreza de espírito - deverá voltar a modelar e inspirar a humanidade. A resignação, a docilidade e o servilismo, por sua volta, serão sucedidos pela ação, pela inconformidade e pelo domínio - A lamúria do resignado, cederá lugar ao grito do forte!


Os próprios símbolos que cercam Zaratustra, a águia e a serpente (meinen Adler und meine Schlange), antigas metáforas zoológicas do orgulho, da arrogância e da astúcia, contrapõem-se às do cordeiro e do peixe - os favoritos de Cristo - ícones da mansidão, da quietude e da simplicidade. Se Cristo pregou o Sermão da Montanha para os pobres de espirito, Zaratustra lança sua isca para alçar os destemidos. O seu é um Evangelho dos Fortes. Sua mensagem não é para todos, é para poucos.


Viver perigosamente


"Ich seht nach oben, wenn ihr nach Erhebung verlangt. Und ich sehe hinab, weil ich erhoben bin. Wer von euch kann zugleich lachen und erhoben sein? Wer auf den höchsten Bergen steigt, der lacht über alle Trauer-Spiele und Trauer-Ernste."


"Olhais para o alto quando aspirais elevar-vos. Eu, como já encontro-me acima, olho para baixo/ Quem entre vocês pode estar acima e ao mesmo tempo gargalhar? Aquele que escalou o mais elevado dos montes, ri-se de todas as tristezas encenadas da vida." - Zaratustra - da leitura e da escrita


Enquanto Zaratustra pregava na ágora, a atenção da multidão desviou-se para o alto onde estava um equilibrista numa frágil corda. Um outro, um rival, afobando-se, terminou por precipitar-se no chão, estatelando-se agonizante bem perto do profeta. O desastrado homem, no seu estertor, acredita que agora o diabo o arrastará para o inferno. Confortando-o, Zaratustra diz-lhe: "Amigo - palavra de honra que tudo isso não existe, não há diabo nem inferno. Sua alma ainda há de morrer mais rápido do que seu corpo: nada tema". Quando o trapezista caído ainda se lamenta pela vida que levou "recebendo pancadas e passando fome", o profeta consolou-o respondendo: "Não, você fez do perigo sua profissão, coisa que não é para ser desprezada"( du hast aus der Gefahr deinen Beruf gemacht). Dito isso ele mesmo trata de sepultá-lo com suas próprias mãos.


A cena do profeta tendo em seus braços um morto, é a "pietá" de Nietzsche. Este é o modelo de homem do profeta, o que compete, o corajosos que arrisca, o que diariamente vive na corda bamba, e que morre por isso mesmo, por levar uma vida perigosa (ein gefährliches leben).


Os companheiros de Zaratustra


Zaratustra quer é o leão (tela de Delacroix)




Como o povo (Volke) não lhe deu ouvidos, Zaratustra, resmungando "que me interessam a praça pública, o populacho e as orelhas cumpridas do populacho?", concluiu então que precisava de companheiros (Gefährten): os "que desejam seguir a si mesmos, para onde quer que eu vá". Afinal ele viera "para separar muitos do rebanho". Que tipo de companhia quer o profeta? Justamente os que "os bons e justos" mais odeiam - o que lhes despedaça os valores, o infrator, o destruidor - porque é esse o criador.


Não são os negligentes nem os retardados que o seguirão, mas sim os inventivos, os que colhem e se divertem, os solitários e todos aqueles unidos pela solidão, interessados em escutar coisas inauditas - a marcha do profeta será a marcha deles. Assim é que sua oração dirige-se para os que estão atacados pela "Grande Náusea"(der grossen Ekel), o tédio de quem vive numa época em que o antigo deus morreu, mas que não existe ainda nenhum outro novo deus. Zaratustra veio para afastar deles a sombra dos deuses antigos que ainda escondem-se atrás das nuvens do presente. Veio para mostrar-lhes a verdadeira face da natureza, chegou par torná-la humana, para desmagizá-la.


O que irritava sobremodo o profeta era o último homem (letzter Mensch), um teimoso, "inabalável como um pulga", que, segundo Heidegger, não queria "se desfazer da sua depreciável maneira de ser". Ao insistir em viver de acordo com os valores desaparecidos, em prender-se a um ídolo que já se fora, esse cabeça-dura continuava a freqüentar o santuário do deus caído em ruínas. Ali, nada mais achando nele, o estulto agachava-se, arrastava-se no pó, em meio aos cacos, atrás das cobras e dos sapos para adorá-los.


A transformação do homem


"Was gross ist am Menschen, das ist, dass er eine Brücke und kein Zweck ist: was geliebt werden kann am Menschen , das ist, dass er ein Übergang und ein Untergang ist"


"A grandeza do homem é ser ele uma ponte, e não uma meta; o que se pode amar no homem é ser ele uma transição e um ocaso." - F.Nietzsche - Assim falou Zaratustra, I,4


Num primeiro momento da história espiritual do homem, pelo menos o de espírito sadio, ele não passa de um camelo, que, como o desgraçado animal, apenas ajoelha-se e agradece quando lhe dão uma boa carga. Carrega pelo deserto as culpas por ter nascido. Na sua humilde corcova avoluma-se as penas do mundo, sobrecarregado pelas regras morais e pelas imposições que lhe fazem, que lhe dizem - tu deves (Du-sollst!)! Porém, no deserto, isolado, dá-se uma transformação. O camelo vira um leão. É o espirito que, liberto, quer ser "o senhor do seu próprio deserto". Agora é ele quem, rugindo desafiante, responde - eu quero! (Ich will!). Se bem que o leão não consiga ainda criar os novos valores, ele pelo menos, assentado na sua força e vigor, sacode para fora a canga que afligia o pobre camelo. Dá-se então a derradeira transformação - o leão vira criança. Sim porque a criança é esquecimento, é um novo começo, é o embrião do super-homem que, ao crescer e desenvolver-se, "quer conseguir o seu mundo".
O camelo (Kamele) O leão (Löwe) A criança (Kind)
O espirito do homem na sua época religiosa e cordata, conforme com seu destino de animal de carga, submetido ao grande dragão. - Encontra-se sob o imperativo do "Tu deves!" A emergência do espirito de rebeldia. A insubordinação contra os valores tradicionais e contra as imposições morais e convencionais. - Afirma-se através do "Eu quero!" A nova era que nasce. O tudo por fazer que se descortina numa nova situação, num mundo novo que se livrou do passado opressivo. - "Ele alcançará!"




O camelo, símbolo do conformismo e da resignação




Os inimigos do profeta


Zaratustra é um celebrante da carnalidade, um pregador da vida vivida, da sensualidade, do prazer de dominar, ou do simples gozo em existir. É o grito do instinto sufocado! Por conseqüência, seus inimigos são os que detestam a vida, os "acusadores da vida" (Ankläger des Lebens), os que reprimem e condenam a volúpia, os que dizem que as pulsões humanas são artes do demônio, os que pregam o Outro Mundo, como os sacerdotes e os moralistas, que insistem em fazer com que o homem envergonhe-se do seu próprio corpo e das suas sensações, chamando-as inumanas, imundas e pecadoras.


O profeta quer o diferente, o que se distingue, o que se vangloria, o altivo com justa razão, o indivíduo soberano e viril, não as massas que "trazem mau olhado à Terra". Suas palavras não devem ser "apanhadas por patas de carneiros". Logo todos os democratas, os pregadores da igualdade e correlatos, são seus adversários, os odiados inimigos. Pois o mundo "gira ao redor dos inventores de valores novos" (die Erfinder von neuen Werten dreht sich die Welt), da Personalidade Magnífica e não do homem comum, que vive discursando - "somos todos iguais perante Deus ". Ora, como deus morreu o homem superior ressuscitou da sua sepultura. É para ele que a luz do futuro brilha.


É tudo um só mundo


Não há para o profeta dois mundos, o de cá e o de lá, nem corpo separado da alma, nem bem nem mal. Tudo é uma coisa só. Carne é espirito, a terra também é céu, o mal também é o bem. O homem imaginou haver um além porque ele sonha, e no seu sonho - "vapor colorido diante dos olhos" - lhe aparecem fantasmas dos mortos e das coisas passadas, por isso ele, iludido, concebeu um Outro Mundo. Ingrato, ao invés de exultar com a existência recebida, percorre os céus com os olhos supersticiosos atrás de uma estrela, acreditando ir parar ao seu lado no futuro.


Seguidor de Heráclito - que via o Cosmo um produto do agón, da luta -, Zaratustra assegurava que toda a batalha a ser travada é uma bem-vinda guerra terrestre na qual o super-homem (expurgando ou afastando de si os sentimentos caritativos e piedosos, afirmando-se sobre si mesmo com os valores que ele mesmo criou) se lançará na conquista do devir. Mas, adverte, antes do super-homem atingir esse futuro, haverá o crescimento do deserto - uma grande ameaça ao oásis onde se homiziava o homem superior.


O filho de Zaratustra


No final do canto de Zaratustra (Parte IV - o sinal), depois do profeta ter dispensado os grandes dignatários (rei, imperador e o papa), não identificando neles os sinais do super-homem, ele projeta aquele que advirá. A sua nobreza não é resultado de títulos, nem de sangue. O Übermensch é o que irá superar o homem e, para tanto, já expurgou de si toda a fraqueza e vilania tão comum aos humanos. Ele não tem pejo em querer vingar-se, nem se envergonha em ter ódio, sabe que se almeja a alegria também terá que suportar o sofrimento. Mas nem os homens superiores que o profeta encontrou pelo caminho o satisfazem.


"Pois bem!", disse ele, "estes homens superiores adormecem enquanto eu estou desperto. Não são os meus verdadeiros companheiros". O viajante (der Wanderer) após ter percorrido uma longa peregrinação, na qual esgrimiu-se em mil encontros e outros tantos percalços, recolheu-se de volta ao seu ermitério. Sentado na pedra em frente a gruta ele pede que cantem "Outra Vez", porque ele afirmava o Eterno Retorno das coisas. Tudo o que aconteceu nos remotos tempos voltaria a ocorrer - a história é um circulo não uma ascensão! Palavras como honra e nobreza certamente voltarão a reluzir.


A hora de Zaratustra


Com seus cabelos embranquecidos eriçados pelos vôos dos pássaros, o sábio sentiu que o leão estendido aos seus pés recostara a cabeçorra dourada no seu colo, lambendo as lágrimas que escorriam pelas suas mãos. O vidente estava exausto. Afinal ele era um montanhista (ein Bergsteiger) que detestava as planícies. Meditando, Zaratustra foi tomado de súbita emoção. Sentiu-se maduro porque que soara a sua hora, a sua alvorada - o Grande Meio-Dia chegara. O anúncio, o sinal de que o super-homem estava por vir fez com que ele, lépido, aspirando somente a sua obra, deixasse a sua gruta. Assim como o alvorecer sai por detrás das montanhas escuras, ele saiu para ir receber o seu filho.


Dies ist mein Morgen, mein Tag hebt an: berauf nun, berauf, du grosser Mittag! - Also spracht Zarathustra, und verliess seine Höhle, glühen und stark, wie eine Morgensonne, die aus dunklen Bergen Kommt.


Leituras fundamentais


Zaratustra: tragédia nietzschiana, de Roberto Machado (Jorge Zahar Editor, RJ, 1997, Editora, 175 págs.)


O "Zaratustra" de Nietzsche, de Pierre Hébert-Suffrin (Jorge Zahar Editor, RJ, 1991, 161 págs.)


Traduções


Capa do Zaratustra (1ª edição, 1883)




Nietzsche é um autor reconhecidamente difícil de ser traduzido, não só por escrever num alemão clássico, extremamente refinado, mas por razões que lhe são próprias. Ele é, como o leitor não se cansa de ver no "Assim falou Zaratustra", um poeta e um filósofo, fazendo que o seu tradutor se embarace ao tentar reproduzir o som harmonioso da lira, ou o pio preciso e mais frio da coruja. Além disso a prosa filosófica alemã naturalmente vocacionada à metafísica, à abstração pura, apresenta complexidades diversas para qualquer tradutor de qualquer idioma. Em cada palavra poderá haver implicações outras, duplas, triplas, quadruplas, ... inúmeras.


Em português existem as conhecidas traduções de Mario da Silva (Círculo do Livro, SP), que é uma das mais antigas (relançada pela Editora da Civilização Brasileira, RJ), a de Eduardo Nunes Fonseca (da Hemus - Editora, SP) e, finalmente, uma bem mais recente, feita por Pietro Nassetti (Editora Martin Claret, SP) que conseguiu fazer da sua tradução do "Zaratustra" uma excelente leitura. Assim falou Zaratustra, de Friedrich Nietzsche (Editora Martin Claret, São Paulo, 1999, 255 págs., tradução de Pietro Nassetti)




Aquilo que se faz por amor está sempre além do bem e do mal.




O homem é definido como um ser que evolui, como o animal é imaturo por excelência.
Certos pavões escondem de todos os olhos a sua cauda - chamando a isso o seu orgulho.


A vontade é impotente perante o que está para trás dela. Não poder destruir o tempo, nem a avidez transbordante do tempo, é a angústia mais solitária da vontade.


Logo que, numa inovação, nos mostram alguma coisa de antigo, ficamos sossegados.


A vontade se superar um afecto não é, em última análise, senão vontade de um outro ou de vários outros afectos.


A vantagem de ter péssima memória é divertir-se muitas vezes com as mesmas coisas boas como se fosse a primeira vez.


Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar, para atravessar o rio da vida.
- ninguém, exceto tu, só tu.
Existem, por certo, atalhos sem números, e pontes, e semideuses que se oferecerão para levar-te além do rio; mas isso te custaria a tua própria pessoa; tu te hipotecarias e te perderias.
Existe no mundo um único caminho por onde só tu podes passar.
Onde leva?
Não perguntes, segue-o!



A vida vai ficando cada vez mais dura perto do topo.


As convicções são inimigas mais perigosas da verdade do que as mentiras


É mais fácil lidar com uma má consciência do que com uma má reputação.


Não há fatos eternos, como não há verdades absolutas.


O que não provoca minha morte faz com que eu fique mais forte.


Para a maioria, quão pequena é a porção de prazer que basta para fazer a vida agradável!


Os grandes intelectuais são céticos.


 Objeção, o desvio, a desconfiança alegre, a vontade de troçar são sinais de saúde: tudo o que é absoluto pertence à patologia.




Temos a arte para não morrer da verdade.


Torna-te aquilo que és


A moralidade é a melhor de todas as regras para orientar a humanidade.


No matrimónio existem apenas obrigações e alguns direitos.


Tudo é precioso para aquele que foi, por muito tempo, privado de tudo.


Quem, em prol da sua boa reputação, não se sacrificou já uma vez - a si próprio?


É pelas próprias virtudes que se é mais bem castigado.


Culpamos as pessoas das quais não gostamos pelas gentilezas que nos demonstram.


Nós fazemos acordados o que fazemos nos sonhos: primeiro inventamos e imaginamos o homem com quem convivemos - para nos esquecermos dele em seguida.


A vida mais doce é não pensar em nada.


O que é o macaco para o homem? Uma risada ou uma dolorosa vergonha.


No convívio com sábios e artistas facilmente nos enganamos no sentido oposto: não é raro encontrarmos por detrás dum sábio notável um homem medíocre, e muitas vezes por detrás de um artista medíocre - um homem muito notável.


"Sei a minha sina.
Um dia meu nome será lembrança de algo terrível.
De uma crise como jamais houve sobre a Terra.
Da mais profunda colisão de consciências.
De uma decisão conjurada contra tudo que até então foi acreditado, santificado, requerido.
Não sou um ser humano, sou uma dinamite, na transvaloração de todos os valores. 
Eis a minha fórmula para um ato de suprema octognose da humanidade que em mim se fez gene e carne..."



Todos vós, que amais o trabalho desenfreado (...), o vosso labor é maldição e desejo de esquecerdes quem sois.


Encontra-se sempre, aqui e ali, algum semi-deus que consegue viver em condições terríveis, e viver vencedor! Quereis ouvir os seus cantos solitários? Escutai a música de Beethoven.


Logo que comunicamos os nossos conhecimentos, deixamos de gostar deles suficientemente.


Quem luta com monstros deve velar por que, ao fazê-lo, não se transforme também em monstro. E se tu olhares, durante muito tempo, para um abismo, o abismo também olha para dentro de ti.


O atractivo do conhecimento seria pequeno se no caminho que a ele conduz não houvesse que vencer tanto pudor.


Se se tem caráter, tem-se também uma experiência típica própria, que sempre retorna.

Uma vez tomada a decisão de não dar ouvidos mesmo aos melhores contra-argumentos: sinal do caráter forte. Também uma ocasional vontade de se ser estúpido.

Quem for fundamentalmente um mestre, apenas toma a sério tudo o que se relaciona com os seus discípulos, - incluindo a si próprio.

Na vingança e no amor a mulher é mais bárbara do que o homem.

Ter-se vergonha da sua imoralidade: é um degrau na escada em cujo extremo se tem também vergonha da nossa moralidade.

Fiquei magoado, não por me teres mentido, mas por não poder voltar a acreditar-te.

É mais difícil ferir a nossa vaidade justamente quando foi ferido o nosso orgulho.

O verdadeiro homem quer duas coisas: perigo e jogo. Por isso quer a mulher: o jogo mais perigoso.


A mulher foi o segundo erro de Deus.


Uma pessoa continua a trabalhar porque o trabalho é uma forma de diversão. Mas temos de ter cuidado para não deixarmos a diversão tornar-se demasiado penosa.


Um homem de génio é insuportável se, além disso, não possuir pelo menos duas outras qualidades: gratidão e asseio.


Há sempre alguma loucura no amor. Mas há sempre um pouco de razão na loucura.


Não é a força mas a constância dos bons resultados que conduz os homens à felicidade.


O castigo foi feito para melhorar aquele que o aplica.


O criminoso não está, muitas vezes, á altura do seu ato: amesquinha-o e difama-o.


Observou-se mal a vida se não se tiver visto também a mão que, de uma maneira especialmente cuidadosa - mata.


O amor é o estado no qual os homens têm mais probabilidades de ver as coisas tal como elas não são.


Só se pode alcançar um grande êxito quando nos mantemos fiéis a nós mesmos.


Quanto mais nos elevamos, menores parecemos aos olhos daqueles que não sabem voar.


Muitos são os obstinados que se empenham no caminho que escolheram, poucos os que se empenham no objetivo.


Se temos que mudar de opinião a respeito de alguém levamos-lhe muito a mal o incómodo que assim nos causa.


Com os princípios quer-se tiranizar os hábitos, ou justificá-los ou honrá-los ou injuriá-los ou escondê-los: - dois homens com princípios iguais querem, verosimilmente, atingir com eles algo de fundamentalmente diferente.


Não se odeia quando pouco se preza, odeia-se só o que está à nossa altura ou é superior a nós.


Em última análise, amam-se os nossos desejos, e não o objecto desses desejos.


Querer a verdade é confessar-se incapaz de a criar.


A mulher aprende a odiar na medida em que desaprende - de encantar.


Aquele que sabe mandar encontra sempre quem deva obedecer.


Não é a intensidade dos sentimentos elevados que faz os homens superiores, mas a sua duração.


Uma alma que se sabe amada, mas que por sua vez não ama, denuncia o seu fundo: - vem á superfície o que nela há de mais baixo.


Quando adestramos a nossa consciência, ela beija-nos ao mesmo tempo que nos morde.


Há uma inocência na mentira que é o sinal da boa fé numa causa.


Se os esposos não vivessem juntos, haveria mais matrimónios felizes.


Perdido seja para nós aquele dia em que não se dançou nem uma vez! E falsa seja para nós toda a verdade que não tenha sido acompanhada por uma gargalhada!


Aquele que vive de combater um inimigo tem interesse em o deixar com vida.


Deus está morto: mas, considerando o estado em que se encontra a espécie humana, talvez ainda por um milénio existirão grutas em que se mostrará a sua sombra.


Para a mulher, o homem é um meio: o objetivo é sempre o filho.




Máscaras. - Há mulheres que, por mais que as pesquisemos, não têm interior, são puras máscaras. É digno de pena o homem que se envolve com estes seres quase espectrais, inevitavelmente insatisfatórios, mas precisamente eles são capazes de despertar da maneira mais intensa o desejo do homem: ele procura a sua alma - e continua procurando para sempre.






O homem que vê mal vê sempre menos do que aquilo que há para ver; o homem que ouve mal ouve sempre algo mais do que aquilo que há para ouvir.


Não há fenómenos morais, mas apenas uma interpretação moral de fenómenos....


Quando se amarra bem o próprio coração e se faz dele um prisioneiro, pode-se permitir ao próprio espírito muitas liberdades.


Até Deus tem um inferno: é o seu amor pelos homens.


Os erros de grandes homens... são mais fecundos que as verdades de pequenos.


Um procura um parteiro para os seus pensamentos, outro alguém a quem possa ajudar: é assim que nasce uma boa conversa.


Quanto mais abstracta for a verdade que queres ensinar, mais tens que seduzir os sentimentos a seu favor.


Quem se despreza a si próprio não deixa mesmo assim de se respeitar como desprezador.


É verdade que se mente com a boca; mas a careta que se faz ao mesmo tempo diz, apesar de tudo, a verdade.


A vaidade dos outros só vai contra o nosso gosto quando vai contra a nossa vaidade.


As próprias mulheres, no fundo de toda a sua vaidade pessoal, têm sempre um desprezo impessoal - pela mulher.




Oração ao DEUS desconhecido.
Antes de prosseguir em meu caminho e lançar o meu olhar para a frente, uma vez mais elevo, só, minhas mãos a Ti de quem eu fujo. A Ti das profundezas de meu coração, tenho dedicado altares festivos para que, em cada momento, Tua voz me pudesse chamar. Sobre esses altares estão gravadas em fogo palavra s: "Ao Deus desconhecido". Teu, sou eu, embora até o presente tenho me associado aos sagrilégios. Teu, sou eu, não obstante os laços que me puxam para o abismo. Mesmo querendo fugir, sintos-me forçado a servir-Te.eu quero Te conhecer, desconhecido. Tu, que me penetras a alma e, qual turbilhão, invades a minha vida. Tu, o incompreensível, mas meu semelhante, quero te conhecer, quero servir só a Ti.





O homem precisa daquilo que em si há de pior se pretende alcançar o que nele existe de melhor.


A ideia do suicídio é uma grande consolação: ajuda a suportar muitas noites más.


A sensualidade ultrapassa muitas vezes o crescimento do amor, de forma que a raiz permanece fraca e arranca-se facilmente.


Os advogados de um criminoso só raras vezes são suficientemente artistas para aproveitar em favor do réu a terrível beleza do seu ato.


Os advogados de um criminoso só raras vezes são suficientemente artistas para aproveitar em favor do réu a terrível beleza do seu ato.


A recompensa final dos mortos é não morrer nunca mais.


Os leitores extraem dos livros,consoante o seu carácter,a exemplo da abelha ou da aranha que,do suco das flores retiram,uma o mel,a outra o seu veneno. 


O gosto de minha morte na boca deu-me perspectiva e coragem. O importante é a coragem de ser eu mesmo.


Você vive hoje uma vida que gostaria de viver por toda a eternidade?


Odeio as almas estreitas, sem bálsamo e sem veneno, feitas sem nada de bondade e sem nada de maldade.


"A fé é ignorar tudo aquilo que é verdade."


E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música.


Não há nada que deprima mais o ser humano (mais depressa) do que a paixão do ressentimento.


Falta de amigos - A falta de amigos faz pensar em inveja ou presunção. Há pessoas que devem seus amigos à feliz circunstância de não ter motivo para a inveja


Para ver muita coisa é preciso despregar os olhos de si mesmo


Abençoados sejam os esquecidos, pois tiram maior proveito dos equívocos. 


“Eu jamais iria para a fogueira por uma opinião minha, afinal, não tenho certeza alguma. Porém, eu iria pelo direito de ter e mudar de opinião, quantas vezes eu quisesse.”


A melhor cura para o amor é ainda aquele remédio eterno: amor retribuído.


Nunca odiamos aos que desprezamos. Odiamos aos que nos parecem iguais ou superiores a nós.


" A todos com quem realmente me importo, desejo sofrimento, desolação, doença, maus-tratos, indignidades, o profundo desprezo por sí, a tortura da falta de alto-confiança, e a desgraça dos derrotados".




A Minha Felicidade 

Depois de estar cansado de procurar 
Aprendi a encontrar. 
Depois de um vento me ter feito frente 
Navego com todos os ventos.



Minha solidão não tem nada a ver com a presença ou ausência de pessoas… Detesto quem me rouba a solidão, sem em troca me oferecer verdadeiramente companhia….”




...Algo que não se pode buscar, nem achar, e talvez tampouco perder. "A alma nobre tem reverência por si mesma..."




"Se se quer ser alguém, deve venerar-se a própria sombra."


ASSIM FALOU ZARATUSTRA
DO NOVO ÍDOLO

Estado, chamo eu, o lugar onde todos, bons ou malvados, são bebedores de veneno; Estado, o lugar onde todos, bons ou malvados, se perdem a si mesmos; Estado, o lugar onde o lento suicídio de todos chama-se – “vida”!
Olhai esses supérfluos! Roubam para si as obras dos inventores e os tesouros dos sábios; “culturas” chamam a seus furtos – e tudo se torna, neles, em doença e adversidade!
Olhai esses supérfluos! Estão sempre enfermos, vomitam fel e lhe chamam “jornal”. Devoram-se uns aos outros e não podem, sequer digerir-se.
Olhai esses supérfluos! Adquirem riquezas e, com elas, tornam-se mais pobres. Querem o poder e, para começar, a alavanca do poder, muito dinheiro – esses indigentes!
Olhai como sobem trepando, esses ágeis macacos! Sobem trepando uns por cima dos outros e atirando-se mutuamente, assim no lodo e no abismo.
Ao trono, querem todos, subir: é essa a sua loucura. Como se no trono estivesse sentada a felicidade! Muitas vezes, é o lodo que está no trono e, muitas vezes, também o trono no lodo.
Dementes, são todos eles, para mim, e macacos sobre excitados. Mau cheiro exala o seu ídolo, o monstro frio; mau cheiro exalam todos eles, esses servidores de ídolos!
Porventura, meus irmãos, quereis sufocar nas exalações de seus focinhos e de suas cobiças? Quebrai, de preferência, os vidros das janelas e pulai para o ar livre!
Fugi do mau cheiro! Fugi da idolatria dos supérfluos!
Fugi do mau cheiro! Fugi da fumaça desses sacrifícios humanos!
Também agora, ainda a terra está livre para as grandes almas. Vazios estão ainda para a solidão a um ou a dois, muitos sítios, em torno dos quais bafeja o cheiro de mares calmos.
Ainda está livre, para as grandes almas, uma vida livre. Na verdade, quem pouco possui, tanto menos pode tornar-se possuído. Louvado seja a pequena pobreza!
Onde cessa o Estado, somente ali começa o homem que não é supérfluo – ali começa o canto do necessário, essa melodia única e insubstituível.
Onde o Estado cessa – olhai para ali, meus irmãos! Não vedes o arco-íris e as pontes do super-homem?





A arte deve antes de tudo e em primeiro lugar embelezar a vida, portanto fazer com que nós próprios nos tornemos suportáveis e, se possível, agradáveis uns aos outros.


Eu não sei o que quero ser, mas sei muito bem o que não quero me tornar


Mesmo o mais forte tem seu momento de fatiga.


Falar muito de sí mesmo, pode ser um jeito de esconder aquilo que realmente é


Homens convictos são prisioneiros.


Ser mau é tão insensato e auto-destrutivo quanto ser bom.


"Nossos filhos não são nossos. Eles são filhos da vida ansiando pela vida."


A fé não move montanhas. Na verdade, coloca montanhas onde não há nenhuma.




"O fantasioso nega a verdade para si mesmo; o mentiroso apenas para os outros."


Éramos amigos e agora somos estranhos um ao outro. Mas não importa que assim o seja: não procuremos escondê-lo ou calá-lo como se isso nos desse razão para nos envergonhar. Somos dois navios cada um dos quais com o seu objetivo e a sua rota particular




Os pais fazem dos filhos, involuntariamente, algo semelhante a eles, a isso denominam 'educação', nenhuma mãe duvida, no fundo do coração, que ao ter seu filho, pariu uma propriedade; nenhum pai discute o direito de submeter o filho aos seus conceitos e valorações.




Olhai-os, os crentes de todas as fés! A quem odeiam mais que todos? Àquele que parte suas tábuas de valores, o destruidor, o criminoso; mas esse é o criador. (Assim falou Zaratustra. p. 39)


A vida é dura de suportar; mas, por favor, não vos façais de tão delicados! Não passamos,todos juntos, de umas lindas bestas de carga.


Quem de vós pode, ao mesmo tempo, rir e sentir-se elevado?
Aquele que sobe ao monte mais alto, esse ri-se de todas as tragédias, falsas ou verdadeiras.
Corajosos, despreocupados, escarninhos, violentos ― assim nos quer a sabedoria: ela é mulher e ama somente quem é guerreiro.



Falsos valores e palavras ilusórias: são estes os piores monstros para os mortais; longamente e à espera, dorme neles a fatalidade.




Ai de mim, é este o meu desgosto: introduziram, mentindo, prémio e castigo no fundo das coisas - e, agora, também no fundo de vossas almas, ó virtuosos.


Não existem fatos, apenas interpretações.


Eu sou uma banheira transbordando sentimentos. E não tem ninguém pra fechar a torneira.


Aquele que quer aprender a voar um dia precisa primeiro aprender a ficar de pé, caminhar, correr, escalar e dançar; ninguém consegue voar só aprendendo voo.


Eu tenho o meu caminho. Você tem o seu caminho. Portanto, quanto ao caminho direito, o caminho correto, e o único caminho, isso não existe.


A igreja cristã é uma enciclopédia de cultos pré-históricos


"Amo os valentes; mas não basta ser espadachim - deve-se saber, também, contra quem sacar a espada!"


Se queres ser feliz nesse mundo, Estrangula sua consciência!


O Homem perde o poder, quando é contaminado pelo sentimento de piedade.


Porque, note-se bem: foi precisamente nos anos da minha mais dèbil vitalidade que eu cessei de ser pessimista: a necessidade instintiva de restabelecer-me, afastou-me da filosofia da miséria e do desânimo...


"Quem quiser permanecer limpo entre os homens, deve aprender a banhar-se em água suja"


O cristianismo tomou o partido de tudo o que é fraco, baixo, incapaz, e transformou em um ideal a oposição aos instintos de conservação da vida saudável; e até corrompeu a faculdade daquelas naturezas intelectualmente poderosas, ensinando que os valores superiores do intelecto não passam de pecados, desvios, 'tentações'. O mais lamentável exemplo: a concepção de Pascal, que julgava estar a sua razão corrompida pelo pecado original; estava corrompida sim, mas apenas pelo seu cristianismo!.




O casamento transforma muitas loucuras curtas em uma longa estupidez.


Enquanto o padre, esse negador, caluniador e envenenador da vida por profissão for aceito como uma variedade de homem superior, não poderá haver resposta à pergunta: Que é a verdade? A verdade já foi posta de cabeça para baixo quando o advogado do nada foi confundido com o representante da verdade.


Nada lhe pertence mais que seus sonhos.






O sofrimento, entretanto, é necessário para a formação do homem; todo homem de boa compleição deve trilhar esse caminho:
"Essas dores podem ser bastante penosas: mas sem dores não é possível tornar-se guia e educador da humanidade; e coitado daquele que quisesse sê-lo e não tivesse essa pura consciência!"
Por fim, o gênio que sobrevive ao sofrimento que lhe cria e lhe acompanha acaba superando as noções de "bom" e "mau", e a moral existirá apenas como um vestígio de uma cultura inferior:
Enfim, quando a tábua de sua alma estiver totalmente coberta de esperiências, ele não desprezará nem odiará a existência e tampouco e amará mas estará acima dela ora com o olhar da alegria, ora com o da tristeza, e tal como a natureza terá uma disposição ora estival, ora outonal.
Quando o seu olhar tiver se tornado forte o bastante para ver o fundo, na escura fonte de seu ser e de seus conhecimentos, talvez também se tornem visíveis para você, no espelho dele, as distantes constelações das culturas vindouras.

































segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

SCHOPENHAUER








Arthur Schopenhauer foi um filósofo alemão do século XIX da corrente irracionalista. Nasceu em Danzig, na Prussia, 22 de Fevereiro 1788 e morreu em Frankfurt am Main, 21 de Setembro 1860.


Pessimista em sua visão do mundo, considerou ser a Vontade a última e mais fundamental força da natureza, que se manifesta em cada ser no sentido da sua total realização e sobrevivência. O conceito de Vontade deste filósofo diz respeito a algo infinito, uno, indizível, e não a uma vontade finita, individual, ciente. Ela estaria presente no homem, como em toda a natureza. Para Schopenhauer, a realidade é vontade irracional, onde o finito nada mais é que mera aparência da realidade. A vontade infinita, traz com ela a característica da insaciabilidade, sendo então algo conflituoso que geraria dor e sofrimento ao homem.


Iniciou estudos de medicina na universidade de Gottingen, mudando depois para filosofia, na universidade de Berlim. Sua tese Vierfach Wutzel der Zats uber zurechern Grund ( "Sobre a quádrupla raiz do princípio da razão suficiente") foi escrita em 1813. O difícil convívio com sua mãe com certeza marcou sua personalidade mas ela lhe permitiu conhecer intelectuais como Goethe (1749-1832), que freqüentavam sua casa em Weimar, centro da vida cultural alemã em sua época. Com a herança recebida do pai pôde viver sua vida de solteiro com relativo conforto e inteiramente entregue ao seu trabalho intelectual. Seu principal livro, Die Welt als Wille and Vorstellung ou "O Mundo como vontade e representação" (1819), embora o seu livro Parerga e Paraliponema (1851) seja o mais conhecido.




Em geral, chamamos de destino as asneiras que cometemos.


A nossa felicidade depende mais do que temos nas nossas cabeças, do que nos nossos bolsos.




Quanto menos inteligente um homem é, menos misteriosa lhe parece a existência.




A música exprime a mais alta filosofia numa linguagem que a razão não compreende.




As pessoas comuns pensam apenas como passar o tempo. Uma pessoa inteligente tenta usar o tempo.


A solidão é a sorte de todos os espíritos excepcionais.




A Intuição é mais forte que a Razão

Devemos sempre dominar a nossa impressão perante o que é presente e intuitivo. Tal impressão, comparada ao mero pensamento e ao mero conhecimento, é incomparavelmente mais forte; não devido à sua matéria e ao seu conteúdo, amiúde bastante limitados, mas à sua forma, ou seja, à sua clareza e ao seu imediatismo, que penetram na mente e perturbam a sua tranquilidade ou atrapalham os seus propósitos. Pois o que é presente e intuitivo, enquanto facilmente apreensível pelo olhar, faz efeito sempre de um só golpe e com todo o seu vigor. 
Ao contrário, pensamentos e razões requerem tempo e tranquilidade para serem meditados parte por parte, logo, não se pode tê-los a todo o momento e integralmente diante de nós. Em virtude disso, deve-se notar que a visão de uma coisa agradável, à qual renunciamos pela ponderação, ainda nos atrai. Do mesmo modo, somos feridos por um juízo cuja inteira incompetência conhecemos; somos irritados por uma ofensa de carácter reconhecidamente desprezível; e, do mesmo modo, dez razões contra a existência de um perigo caem por terra perante a falsa aparência da sua presença real, e assim por diante.
Em tudo se faz valer a irracionalidade originária do nosso ser.



A glória é tanto mais tardia quanto mais duradoura há de ser, porque todo fruto delicioso amadurece lentamente.


O dinheiro é uma felicidade humana abstracta; por isso aquele que já não é capaz de apreciar a verdadeira felicidade humana, dedica-se completamente a ele.


Nas pessoas de capacidade limitada, a modéstia não passa de mera honestidade, mas em quem possui grande talento, é hipocrisia.


A riqueza influencia-nos como a água do mar. Quanto mais bebemos, mais sede temos..


A arte é uma flor nascida no caminho da nossa vida, e que se desenvolve para suavizá-la.


Quanto mais elevado é o espírito mais ele sofre.

Do mesmo modo que no início da primavera todas as folhas têm a mesma cor e quase a mesma forma, nós também, na nossa tenra infância, somos todos semelhantes e, portanto, perfeitamente harmonizados.

As pessoas comuns pensam apenas como passar o tempo. Uma pessoa inteligente tenta usar o tempo.

Certamente a vida não existe para ser aproveitada, mas para ser suportada e despachada... De fato, é um conforto na velhice ter o trabalho da vida por trás de si.

Quem não tem medo da vida também não tem medo da morte.

Sentimos a dor mas não a sua ausência.

Se na hora de uma necessidade os amigos são poucos? Ao contrário! Basta fazer uma amizade com alguém para que, logo que este se encontre numa dificuldade, pedir dinheiro emprestado..

O destino é cruel e os homens são dignos de compaixão.


Casar-se significa duplicar as suas obrigações e reduzir a metade dos seus direitos.

O dinheiro é a coisa mais importante do mundo. Representa: saúde, força, honra, generosidade e beleza, do mesmo modo que a falta dele representa: doença, fraqueza, desgraça, maldade e fealdade.

O maior erro que um homem pode cometer é sacrificar a sua saúde a qualquer outra vantagem.

O destino baralha as cartas, e nós jogamos.

A ignorância só degrada o homem quando se encontra em companhia da riqueza.

Erguer um monumento a quem está vivo significa declarar que não se pode confiar nos seus pósteros.

Ninguém é realmente digno de inveja, e tantos são dignos de lástima!

Em geral, nove décimos da nossa felicidade baseiam-se exclusivamente na saúde. Com ela, tudo se transforma em fonte de prazer.

A serenidade e a vitalidade da nossa juventude baseiam-se em parte no fato de que nós, ao subirmos a montanha, não vermos a morte, pois ela encontra-se do outro lado da encosta.

Ler quer dizer pensar com uma cabeça alheia, em lugar da própria.

Observei que o carácter de quase todos os homens parece particularmente adaptado a uma certa idade da vida, de modo que nela se apresenta da forma mais proveitosa. Alguns são jovens amáveis, e depois isso passa, outros, homens enérgicos e activos, dos quais a idade rouba todos os valores. Muitos apresentam-se mais favoravelmente na velhice, quando são mais indulgentes por serem mais experientes e serenos.


A honra é, objetivamente, a opinião dos outros acerca do nosso valor, e, subjetivamente, o nosso medo dessa opinião.

Vista pelos jovens, a vida é um futuro infinitamente longo; vista pelos velhos, um passado muito breve.

As religiões, assim como as luzes, necessitam de escuridão para brilhar.

a verdade, só existe prazer no uso e no sentimento das próprias forças, e a maior dor é a reconhecida falta de forças onde elas seriam necessárias.

As causas não determinam o caráter da pessoa, mas apenas a manifestação desse caráter, ou seja, as ações.

Por sabedoria entendo a arte de tornar a vida mais agradável e feliz possível. 

O homem é propriamente falando, um animal que agride.

O bom humor é a única qualidade divina do homem.

Os eruditos são aqueles que leram nos livros; mas os pensadores, os génios, os iluminadores do mundo e os promotores do género humano são aqueles que leram diretamente no livro do mundo.

A compaixão pelos animais 
está intimamente ligada a bondade de caráter, 
e quem é cruel com os animais 
não pode ser um bom homem.

"Assim como a cera, naturalmente dura e rígida, torna-se, com um pouco de calor tão moldável que se pode levá-la a tomar a forma que se desejar, também se pode, com um pouco de cortesia e amabilidade, conquistar os obstinados o os hostis."


Talento é quando um atirador atinge o alvo que os outros não conseguem. Gênio eh quando um atirador atinge o alvo que os outros não vêem.

"O que é a modéstia senão uma humildade hipócrita pela qual um homem pede perdão por ter as qualidades e os méritos que os outros não tem!"

Toda verdade passa por três estágios.
No primeiro, ela é ridicularizada.
No segundo, é rejeitada com violência.
No terceiro, é aceita como evidente por si própria.


O saber humano se espalha para todos os lados, a perder de vista, de modo que nenhum indivíduo pode saber sequer a milésima parte daquilo que é digno de ser sabido.

Vontade: impulso cego, escuro e vigoroso, sem justiça nem sentido.

"Não nos deixar cair em tentação, é o mesmo que dizer: Não nos deixar ver quem realmente somos".

Os "amigos da casa" são chamados desse modo com razão, uma vez que são mais amigos da casa do que do dono, ou seja, assemelham-se mais aos gatos do que aos cachorros.

Nem todos os loucos ou burros são fanáticos, mas todos os fanáticos são loucos ou burros.

Por toda a parte o homem encontra oposição, vive continuamente em luta, e morre segurando suas armas.

O Homem é livre para fazer o que quer, mas não para querer o que quer.


Uma maneira de agradar é deixar que cada um fale de si.


"A mulher é um animal de cabelos longos e idéias curtas


As religiões são como vaga-lumes: para brilhar precisam das trevas.


A Fé é como o amor; não há nada que a force.


Qualquer indivíduo que realmente acredite que seres supra-humanos concederam à nossa raça informações sobre os objetivos de sua existência e do mundo ainda está em sua infância. Não há outra revelação senão os pensamentos dos sábios — e mesmo esses pensamentos estão sujeitos a erros, como é a sina de tudo o que é humano.




Pode-se deduzir que a vida é dor, porque vontade é desejo daquilo que não se tem, é ausência, privação e sofrimento, sobretudo se considerado o fato de que 'Satisafação Duradoura e permanente objeto algum do querer pode fornecer.




Esse é o pior dos mundos possíveis.Com todas as suas variantes e diferenças, com toda a sua multiplicidade, durante o seu desenvolvimento, a realidade íntima do mundo e do homem é sempre a mesma vontade onipotente; a própria história é sempre a repetição do mesmo acontecimento sob aparências diversas: a vontade de viver determinado o sofrimento como condição humana: VIVER É SOFRER..




Não diga a um amigo nada que você esconderia de um inimigo.




A glória deve ser conquistada; a honra, por sua vez, basta que não seja perdida.


Aquele que quer ser tudo não pode ser nada.


Numa certa fase da vida, os homens têm demais, e no fim, muito pouco. (...) passam a metade da vida lidando com putas e a outra metade sendo cornos


É melhor não dizer nada do que ter um diálogo estéril e burro em conversas com os bípedes


Se você for educado e simpático, as pessoas ficam dóceis e obedientes. Assim, a polidez faz com a natureza humana o mesmo que o calor faz com a cera.


A vida interior é reprimida e não pode ser conscientizada porque conhecer nossa natureza mais profunda (nossa crueldade, medo, inveja, desejo sexual, agressividade, egoísmo) seria um peso maior do que poderíamos aguentar.


O conhecimento é limitado, só a estupidez é ilimitada.


Devemos nos proteger da familiaridade e das amizades idiotas.


Desde jovem, percebi que os outros lutavam por bens exteriores, o 
que não me interessava, pois eu tinha dentro de mim um tesouro 
muito mais valioso do que todas as posses materiais. O mais importante era aumentar esse tesouro, bastando desenvolver a mente e ser totalmente livre. (...)





Quando nasce um homem como eu, só se pode desejar uma 
coisa: que consiga ser sempre ele mesmo e viver para seus 
dons intelectuais.



Quando mais jovem, dizia, "minha tendência era ser sociável, mas depois, aos poucos, adquiri um gosto pela solidão, fui ficando pouco sociável e resolvi me dedicar inteiramente a mim pelo resto dessa vida fugaz."




Como somos obrigados a viver, devemos sofrer o menos possível.


Todo mundo deva atuar no teatro de marionetes da vida e 
sentir o arame que nos mantém em movimento.



Ao chegar ao fim da vida, nenhum homem sincero e de posse de suas faculdades vai desejar viver de novo. Preferirá morrer para sempre. 
Um carpinteiro não vai me dizer: "Ouça o discurso que escrevi sobre a arte da carpintaria". Ele se compromete a construir uma casa e constrói. (...) Seja assim você também: coma como um homem, beba como um homem. (...) case-se, tenha filhos, participe da comunidade, saiba como suportar as afrontas e os outros.





O homem nunca é feliz, passa a vida inteira lutando por algo 
que acha que vai fazê-lo feliz. Não consegue e, quando consegue, fica desapontado: ele é um náufrago e chega ao porto de destino sem mastros nem cordâmes. Não interessa mais se ele foi feliz ou infeliz, pois a vida foi sempre apenas o presente, que estava sempre sumindo e agora terminou.





A vida é apenas a morte sendo evitada e adiada. (...) Cada vez que respiramos, afastamos a morte que nos ameaça e assim lutamos com ela a cada segundo".






Como o nosso começo é diferente do fim! 
No começo, temos o delírio do desejo e o êxtase do prazer sensual; no fim, a destruição de todos os órgãos e o cheiro do cadáver em decomposição. (...) Não parece que a vida é um tropeço cujas conseqüências aos poucos ficam mais óbvias?




Sempre quis morrer rápido, pois quem viveu só a vida inteira saberá avaliar melhor esse tema solitário. Em vez de sumir em meio às tolices e bufonerias preparadas para os lastimáveis bípedes humanos, vou terminar feliz, consciente de estar voltando para onde vim (...) e de ter cumprido minha missão.




Estou cansado, no final da estrada (...) Mesmo assim, vejo com alegria o que fiz, sem me intimidar com a opinião dos outros.




— Imperdoável deixa a responsabilidade fora de você, enquanto não perdoar coloca a responsabilidade em quem não quer perdoar —




A fé e o saber não se dão bem dentro da mesma cabeça: são como o lobo e o
cordeiro dentro de uma jaula; e o saber é justamente o lobo, que ameaça devorar seu vizinho.
O saber é feito de uma matéria mais dura do que a fé, de modo que, quando colidem, a última se quebra.





É penoso ouvir roucos cantarem e ver mancos dançarem; mas saber de mentes limitadas que filosofam é insuportável.




Existe no mundo apenas um ser mentiroso: o homem. Todos os outros seres são verdadeiros e sinceros, pois mostram-se abertamente como são e manifestam o que sentem.




O ser humano tornou-se uma caricatura, um monstro; o simples fato de vê-lo já é algo repugnante, que se destaca até pelo branco de sua pele, não natural a ele, e pelas conseqüências repulsivas da sua alimentação à base de carne, que vai contra a natureza, bem como das bebidas alcoólicas, do tabaco, dos excessos e das doenças. Ele surge como uma mácula na natureza!