sexta-feira, 11 de maio de 2012

MARQUES DE SADE








Donatien Alphonse François de Sade, o Marquês de Sade, (Paris2 de junho de1740 — Saint-Maurice2 de dezembro de 1814) foi um aristocrata francês e escritorlibertino. Muitas das suas obras foram escritas enquanto estava na Prisão da Bastilha, encarcerado diversas vezes, inclusive por Napoleão Bonaparte. De seu nome surge o termo médico sadismo, que define a perversão sexual de ter prazer na dor física ou moral do parceiro ou parceiros[1]. Foi perseguido tanto pela monarquia (Antigo Regime) como pelos revolucionários vitoriosos de 1789 e depois por Napoleão.



Filosofia

Além de escritor e dramaturgo, foi também filósofo de ideias originais, baseadas no materialismo do século das luzes e dos enciclopedistas. Lido enquanto teoria filosófica, "o romance de Sade oferece um sistema de pensamento que desafia a concepção de mundo proposta pelos dois principais campos filosóficos no contexto da França pré-republicana: o religioso e o racionalista".[4] Sade era adepto do ateísmo e era caracterizado por fazer apologia ao crime (já que enfrentar a religião na época era um crime) e a afrontas à religião dominante, sendo, por isso, um dos principais autores libertinos - na concepção moderna do termo. Em suas obras, Sade, como livre pensador, usava-se do grotesco para tecer suas críticas morais à sociedade urbana. Evidenciava, ao contrário de várias obras acerca da moralidade - como por exemplo o "Princípios da Moral e Legislação" de Jeremy Bentham- uma moralidade baseada em princípios contrários ao que os "bons costumes" da época aceitavam; moralidade essa que mostrava homens que sentiam prazer na dor dos demais e outras cenas, por vezes bizarras, que não estavam distantes da realidade. Em seu romance 120 Dias de Sodoma, por exemplo, nobres devassos abusam de crianças raptadas encerrados num castelo de luxo, num clima de crescente violência, comcoprofagia, mutilações e assassinatos - verdadeiro mergulho nos infernos.

Obras de Sade

Duas personagens criadas por Sade foram suas idéias fixas durante décadas: Justine (que se materializou em várias versões de romance, ocupando muitos volumes), a ingênua defensora do bem, que sempre acaba sendo envolvida em crimes e depravações, terminando seus dias fulminada por um raio que a rompe da boca ao ânus quando ia à missa, e Juliette, sua irmã, que encarna o triunfo do mal, fazendo uma sucessão de coisas abjetas, como matar uma de suas melhores amigas lançando-a na cratera de um vulcão ou obrigar o próprio papa a fazer um discurso em defesa do crime para poder tê-la em sua cama. As orgias com o papa Pio VI em plena Igreja de São Pedro, no Vaticano, fazem parte da trama sacrílega e ultrajante do romance Juliette, com a fala do pontífice transformada em agressivo panfleto político: A Dissertação do Papa sobre o Crime. Sade tinha o costume de inserir panfletos político-filosóficos em suas obras. O panfleto Franceses, mais um Esforço se Quiserdes Ser Republicanos, que prega a total ruptura com o cristianismo, foi por ele encampado ao romance A Filosofia na Alcova (Preceptores Morais), no qual um casal de irmãos e um amigo libertino "educam" a jovem Euginè para uma vida de libertinagem, mostrando-lhe aversão aos dogmas religiosos e costumes da época[1].

Surrealismo e psicanálise

Tanto o surrealismo como a psicanálise encamparam a visão da crueldade egoísta que a obra de Sade expõe despudoradamente. Um exemplo de influência do Marquês de Sade na arte do século 20 é o cineasta espanhol Luis Buñuel, que em vários filmes faz referências explícitas a Sade: em A Idade do Ouro, por exemplo, retrata a saída de Cristo e dos libertinos do castelo das orgias de Os 120 dias de Sodoma. O sadismo também está explícito nas imagens mais surrealistas produzidas por Buñuel, como a navalha cegando o olho da mulher em O Cão Andaluz. Também há fortes referências sadianas em A Bela da Tarde e em Via Láctea, no qual aparece uma Cena em que Sade converte uma indefesa menina ao ateísmo. A influência de Sade pode ser notada também em autores como o dramaturgo francês Jean Genet, homossexual, ladrão e presidiário, que retoma muitos dos temas do marquês, também desenvolvidos em ambientes carcerários franceses.

Questão da homossexualidade

A questão da suposta homossexualidade de Sade ("Terá sido Sade um pederasta?") foi formulada pela escritora francesa Simone de Beauvoir no clássico ensaio 'É preciso Queimar Sade? - Privilégios'. A autora conclui pela heterossexualidade de Sade, que sempre amou mulheres tolerantes a suas aventuras, embora tivesse um comportamento sexual atípico, defendendo o coito anal e chegando a pagar criados para sodomizá-lo publicamente em suas orgias, das quais a primeira mulher, Renné de Sade, teria participado. Atualmente, estudiosos da cultura e da literatura, como o sociólogo Ottaviano de Fiore, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), compartilham a opinião de Simone de Beauvoir, creditando o comportamento e a imaginação literária do autor de '120 Dias de Sodoma' a neuroses relacionadas a parafilias, como o gosto pelo lixo e pela sujeira, que na ficção sadeana desembocam na apologia do crime e na erotização da fealdade e das mais atrozes torpezas. "A crítica que faço à pergunta de Simone de Beauvoir é que, posta em sua época, ela remete à visão de seres humanos descontínuos,isto é, não vê, como atualmente se vê, um continuum humano, mas vê um mundo repartido em que gays e outras minorias seriam descontínuos em relação a um padrão de ser humano dito normal, isto é, o gay seria o outro, que não partilharia da mesma condição humana, ponto de vista hoje considerado preconceituoso e racista, pois o padrão de ser humano mudou", afirmou Ottaviano de Fiore.

Velhice e legado

Na velhice, já separado de Renné, sua primeira mulher, mas, como sempre, preso por causa de suas idéias e de seu comportamento libertino, foi amparado pela atriz Marie-Quesnet, que mudou-se com ele para o Hospício de Charenton. Nessa época, sob o olhar tolerante de Marie-Quesnet, enamorou-se da filha de uma carcereira que tinha 14 anos quando o conheceu. Todos esses fatos estão rigorosamente documentados por Gilbert Lely, o mais importante biógrafo de Sade, compilador de suas cartas e autor do clássico 'Vida do Marquês de Sade'.
Sade morreu aos 74 anos, amado por duas mulheres, com quem planejava produzir peças teatrais pornográficas quando um dia saísse do hospício.[carece de fontes]






Fonte: Wikipédia









Outras Fontes:


Donatien Alphonse François

A orgia de Marquês de Sade

Obra do homem que originou o termo

Giovana Sanchez | 01/05/2007 
Ninguém jamais recebeu o convite ao lado. Os qua­tro meses passados no ermo castelo Silling, no qual 48 pessoas se enclausuraram para praticar as mais devassas orgias, existiram apenas na mente de Donatien-Alphonse-François de Sade. E fazem parte da obra mais famosa do francês conhecido como Marquês de Sade, Os 120 Dias de Sodoma.
Esses e outros livros, pornográficos e libertinos, tiveram papéis contraditórios na vida de seu autor. Por um lado, o transformaram, muitos anos após sua morte, em um gênio precursor de correntes filosóficas e autor de obras consideradas à frente de seu tempo. Mas, por outro, são responsáveis pela confusão que se faz entre sua vida e sua obra.

A vida
Não que Sade fosse santo. O homem que deu origem à palavra “sadismo” e passou um terço de sua vida preso teve, sim, suas experiências sexuais um tanto incomuns. E era um grande mulherengo. Mas não fez diferente de outros nobres de sua época. “Libertinagem é uma palavra típica do século 18 e ‘libertino’ é um tipo social da época”, afirma Eliane Robert Moraes, professora de Estética e Literatura da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. “O libertino era um aristocrata que desafiava os valores dos homens e de Deus”, diz Eliane, que é autora de, entre outros, Lições de Sade – Ensaios sobre a Imaginação Libertina.
Sade tampouco fez o que escreveu. Sua literatura deu abertura para uma série de mitos construídos sobre si. Como o de que, por exemplo, teria passado seus últimos dias encarcerado solitário, escrevendo com sangue e com as próprias fezes para substituir a pena que havia sido tirada dele, como mostra o filme Contos Proibidos do Marquês de Sade, de 2000. Na verdade, ele passou o fim da sua vida – tão obeso que os movimentos eram prejudicados – em um manicômio, mas ao lado da mulher e de uma amante, e escrevendo muito.
Sade era, antes de tudo, um nobre. Filho de um conde diplomata e militar, ele nasceu em junho de 1740 no palácio de La Coste, em Paris. Seguiu a carreira militar e, aos 16 anos, lutou na Guerra dos Sete Anos, na qual a França e a Áustria disputaram com a Inglaterra e a Prússia territórios e destinos comerciais. Quando voltou do conflito, foi obrigado pelo pai a casar-se com Renée-Pélagie de Montreuil. Filha de uma família de nobreza recente e com influência na corte, Renée tinha dois problemas, que se tornariam as perdições da vida de Sade: uma mãe muito poderosa e uma irmã mais jovem e mais bonita.
O primeiro escândalo na vida do marquês ocorreu cinco meses após o casamento. Em outubro de 1763, foi acusado pela prostituta Jeanne Testard de obrigá-la a renegar Deus e a realizar “atos de sacrilégio” com imagens cristãs enquanto mantinham relações sexuais. Acabou preso, mas, graças à influência da sogra, ficou na cadeia menos de um mês. A sogrona ainda o livrou da forca em 1772, quando Sade intoxicou uma prostituta – em uma festinha, ofereceu à infeliz um bombom com um licor afrodisíaco e ela quase morreu.
Sua esposa sabia de suas traições, mas, mesmo assim, manteve-se a seu lado por 27 anos, além de dar-lhe três filhos. Um deles, Donatien-Claude-Armande, queimou quase todos os manuscritos e correspondências do pai após sua morte. Se Renée fechava os olhos para as escapulidas do marido, o mesmo não fazia sua mãe. De protetora, a sogra passou a perseguidora quando Sade revelou que mantinha um caso com a cunhada, Anne-Prospère. O casal fugiu para a Itália. Ela conseguiu localizá-los e pediu ao rei da Sardenha em pessoa, Carlos Emanuel III, que expedisse uma ordem de prisão contra o marquês – embora sem acusação alguma. A sogra ainda se incumbiu das despesas de seu cárcere forçado na fortaleza de Miolans, em Savóia, entre a Itália e a França. Em abril de 1773, o marquês conseguiu fugir.
Em 1775, outra confusão. Uma orgia envolvendo empregados do castelo, Sade e a própria mulher, Renée, veio à tona. O processo foi aberto pelo pai de uma das criadas que participaram da festa – além de enfrentar o marquês nos tribunais, ele deu dois tiros em Sade, que se salvou graças à má pontaria do atirador.
Em janeiro de 1777, a sorte do nobre mudou. A sogra conseguiu que o rei emitisse uma carta de prisão, chamada lettre de cachet. Dessa vez, por 13 anos. E também sem um crime propriamente dito.

A obra
Até então, Sade era apenas um cara com uma vida amorosa apimentada. Na prisão, isso mudou. Lá – onde, ao todo, passou quase um terço da sua vida, lendo muito –, produziu toda sua obra. Em 1784, foi transferido para a Bastilha, onde escreveu contos e novelas (cerca de 50) e produziu seu primeiro romance, Os 120 Dias de Sodoma ou a Escola da Libertinagem, concluído em apenas 37 dias. Em 2 de julho de 1789, 12 dias antes da tomada da Bastilha, Sade foi transferido para o Sanatório de Charenton sem poder levar nada. Morreu sem saber que seus manuscritos foram achados por um guarda e publicados – mesmo que apenas em 1935.
Se existe uma coisa que o autor Sade não faz é poupar seus leitores. Inspirado nas “sociedades do amor” formadas pelos aristocratas de sua época para satisfazer desejos sexuais, o marquês escreveu a história de uma comitiva que realiza em um castelo as mais bizarras experiências sexuais. Grande parte da obra é dedicada à pedofilia e à descrição de práticas coprofílicas – com fezes humanas.
Em 1790, Sade foi anistiado pela Re­volução e deixou o manicômio. Foi quando Renée o abandonou. Dias depois, porém, o francês conheceu a mulher que seria sua companheira pelo resto de seus dias, Marie-Constance Renelle. E, com seus bens confiscados pela Revolução, envolveu-se na política: virou comissário para a administração de hospitais de um distrito de Paris. Três anos depois, voltou à prisão. A acusação agora era a de se recusar a punir e a condenar os réus: o marquês era malvisto pelos radicais revolucionários por sempre procurar o meio-termo e ser contra a pena de morte. Em liberdade, publicou A Filosofia na Alcova. No livro, conta a história de Eugénie, jovem que tem aulas de libertinagem em uma orgia entremeada por discussões filosóficas. Nele, faz uma irônica denúncia aos revolucionários. Acusado de “moderatismo”, escapou da guilhotina em julho de 1794.
Em março de 1801, com a França sob a batuta de Napoleão, Sade foi levado ao manicômio de novo – e nunca mais o dei­xou. Aos 74 anos, obeso, morreu em sua cela. Foi enterrado no cemitério de Charenton. Sua cova não tinha nenhuma inscrição, apenas uma cruz.

O legado
Apesar de produzir uma obra extensa – da qual apenas um terço foi publicado –, Sade foi um escritor pouco lido em sua época. “Ele sabia que o que escrevia não seria vendido na esquina livremente. Sempre foi um autor clandestino”, afirma Eliane Moraes. Assim ele permaneceu durante todo o século 19. Em 1834, uma edição do Dicionário Universal inaugura o termo “sadismo”, com o significado de “aberração horrível do deboche; sistema monstruoso e anti-social que revolta a natureza”. O nome só se torna famoso, porém, quando usado pelo psiquiatra alemão Richard Freiherr von Krafft-Ebing, num catálogo de psicopatias sexuais, em 1886.
Os livros de Sade chegaram a ser jul­- gados pelos tribunais franceses em 1950, sob a alegação de afronta à moral e aos bons costumes. Aos poucos, artistas como Salvador Dalí e André Masson começam a se inspirar nas imagens sadianas de crueldade para compor suas obras. Para a filósofa e escritora Simone de Beauvoir, a filosofia radical de liberdade de Sade precedia o existencialismo em mais de um século. Há quem o veja, ainda, como um precursor do estudo do foco da sexualidade que permeia toda a psicanálise de Sigmund Freud. Após mais de dois séculos de sua morte, o marquês recebeu dos surrealistas o apelido de “divino”, entrando para o hall de gênios da literatura e da filosofia.
“Ele coloca uma questão fundamental: como lidar com nossas paixões mais cruéis para encontrar um ponto de superação e de civilização”, afirma Rodolfo García Vázquez, um dos fundadores da Companhia de Teatro Os Satyros, que interpreta Sade desde a década de 1990. Ainda hoje o pensamento do marquês é provocador. Vázquez diz que a platéia de Filosofia na Alcova, montagem ainda em cartaz em São Paulo, sempre sai chocada. Não fosse assim, não seria Sade.
“Amigo leitor, prepara teu coração e teu espírito para o relato mais impuro já feito desde que o mundo existe.”*
Você está convidado a mergulhar num mundo em que tudo é liberado. Incesto, homossexualismo, orgias e demais violações das normas da sociedade.

Local: Castelo Silling
Data: 30 de outubro de 1784
Durante 120 dias, 44 pessoas se entregarão aos mais secretos – ou nem tanto – deleites de quatro libertinos. Esqueça seus pudores, seus medos, seus questionamentos morais. Aqui não há lugar para eles.
* FRASE DE SADE NA INTRODUÇÃO DE SEU LIVRO OS 120 DIAS DE SODOMA

Mitos sádicos

Uma série de histórias foi contada sobre o nobre francês - mas poucas são verdadeiras
Muitas histórias nebulosas surgiram em torno de Sade. Com uma vida amorosa repleta de traições e festinhas, várias prisões e uma literatura pornográfica, ele serviu freqüentemente de bode expiatório para muitos crimes praticados por libertinos ricos e impunes de sua época. O próprio marquês confirmou, em uma das cartas que escreveu da prisão, em 1781, à esposa: “Sou um libertino, eu confesso; eu concebi tudo o que se pode conceber nesse gênero, mas seguramente não fiz tudo o que concebi e certamente nunca farei. Sou um libertino, mas certamente não sou nenhum criminoso nem assassino”. Vários crimes foram atribuídos a Sade, mas nunca provados. Eis alguns deles:
• Enviar um exemplar de seu romance Juliette (que contava a vida de uma moça que participa de orgias em um convento e relata cerca de 50 mil crimes) a Napoleão, que teria ateado fogo ao livro.
• Ser encontrado em uma sala com um homem morto colocado em um imenso pote de vidro com álcool. Ele teria matado o sujeito e dissecado o corpo.
• Em 1834, a polícia teria arrombado sua casa e o encontrado deitado no chão, bêbado, junto a seu criado, ambos estendidos sobre poças de sangue e vinho.
• Ser preso em flagrante quando tentava queimar uma mulher viva e nua em sua casa.
• Ter provocado, por intermédio de seus livros cheios de violência e crueldade, assassinatos – como o cometido por um suposto leitor, que teria matado uma jovem que cuidava do marquês no sanatório.

Cartas de um homem sensível

Correspondências revelam um sujeito angustiado e irônico
Preso durante um terço de toda sua vida, Sade se comunicava com o mundo por meio de suas cartas. Seja para as amantes, para a sogra, para a esposa ou para o rei Luís XVI, ele nunca deixou de escrevê-las. Nelas, o marquês se mostra um homem sensível, às vezes apaixonado, às vezes ciumento. Em uma biografia recente, The Marquis de Sade – A Life (“O Marquês de Sade – Uma vida”, inédita em português), o americano Neil Schaeffer traduziu centenas delas. Ele diz em seu site (www.neilschaeffer.com/sade) que “uma das melhores surpresas foi descobrir a riqueza, o humor e a humanidade genuína de suas cartas da prisão”. Muitas vezes seus relatos se mostram angustiados e revoltados, principalmente nas acusações à sogra. Em 1779, escreve a Renée: “Então sua execrável mãe não tem ao menos pena das minhas condições, e, embora esteja completamente consciente de tudo o que enfrento, ela o julga necessário, apenas para instigar sua raiva e a de seus conselheiros, apunhalando-me pelas costas novamente, doente como estou. Ah, besta detestável!” O marquês tem um humor refinado e, a seu secretário, escreve: “Na França não se fala impunemente a respeito de uma puta. Pode-se falar mal do governo, do rei, da religião: tudo isso não é nada. Mas uma puta, senhor Quiros, com os diabos! (...) Por causa dela intrepidamente encerram um cavalheiro na prisão durante 12 ou 15 anos”.


Saiba mais

Livros
Sade – Vida e Obra, de Fernando Peixoto, Paz e Terra, 1979
O livro trata de aspectos curiosos da vida de Sade, assim como de sua obra. Peixoto conta de maneira cronológica a vida do marquês, entremeando análises de seus livros mais importantes.
Lições de Sade – Ensaios sobre a Imaginação Libertina, de Eliane Robert Moraes, Iluminuras, 2006
Eliane é uma das únicas especialistas em Sade no Brasil e, neste livro, versa sobre sua filosofia, sua importância para os autores contemporâneos e seu espírito libertino.
120 Dias de Sodoma, de Marquês de Sade, Iluminuras, 2006
Livro fundamental para a compreensão da obra de Sade, considerado sua obra-prima.
Filmes
Contos Proibidos do Marquês de Sade, de Philip Kaufman, 2000
O filme é beaseado nos últimos dias de Sade no hospício, quando encena peças com os internos.

Fonte: http://guiadoestudante.abril.com.br 



Frases:


Mate-me novamente ou aceite-me como eu sou, por que eu não mudarei.


Não há outro inferno para o homem além da estupidez ou da maldade dos seus semelhantes.

Quando o ateísmo quiser mártires, que o diga, o meu sangue está pronto.


...e que nada nem ninguém é mais importante do que nós próprios. E não devemos negar-nos nenhum prazer, nenhuma experiência, nenhuma satisfação, desculpando-nos com a moral, a religião ou os costumes.


O meu maior desgosto é que Deus, na realidade, não exista, privando-me assim do prazer de o insultar mais positivamente.

Quem sabe se não teremos de ultrapassar muito a natureza para perceber o que ela nos quer dizer?

As paixões humanas não passam dos meios que a natureza utiliza para atingir os seus fins.

A tolerância é a virtude do fraco.

Tudo é bom quando é excessivo.

Nunca devemos admitir como causa daquilo que não compreendemos, algo que ainda entendemos menos.

A ideia de Deus é, confesso, o único erro que não posso perdoar ao homem.

Antes ser um homem da sociedade, sou-o da natureza.

Não há paixão mais egoísta do que a luxúria.


Todo o universo poderia ser conduzido por uma única lei, se essa lei fosse boa.

A primeira lei que a natureza me impõe é gozar à custa seja de quem for.


Romantico, erótico, pornográfico, vida, razão, mulher, homem.

Só me dirijo às pessoas capazes de me entender, e essas poderão ler-me sem perigo.

É sem qualquer terror que eu vejo a desunião das moléculas da minha existência.

Eu não vou deixar de te dizer: o sentido da humanidade é quimérico, nunca capaz de lidar com as paixões, ou mesmo a necessidade, se olharmos para os homens durante séculos devoram uns aos outros.


... A primeira lei da amizade é a confiança ...



... Não é verdade que quanto mais educado você for, mais você irá saborear os prazeres da luxúria?


E eu digo, que valor pode ter para um homem de bom senso com um sentimento sempre em desacordo com a natureza?




A VERDADE 

Qual é essa quimera impotente e estéril
Essa divindade que aos imbecis apregoam
Uma cambada odiosa de padres impostores?
Querem tornar-me num dos seus sectários?
Ó! nunca, juro-o e cumprirei a minha palavra,
Nunca esse bizarro e nojento ídolo,
Esse filho do delírio e do escárnio,
Impressionará minimamente o meu coração.
Contente e orgulhoso do meu epicurismo,
Pretendo expirar no seio do ateísmo.
E que o Deus infame com que pretendem assustar-me
Nunca eu o conceba senão para o blasfemar.
Sim, vã ilusão, a minha alma detesta-te,
E para que te convenças aqui o proclamo.
Gostaria que pudesses viver por um momento
Para gozar o prazer de melhor te insultar.
Qual é, com efeito, esse execrável fantasma,
Esse Deus cagão, esse ser pavoroso
Que não se deixa ver nem dá sinal de vida,
Que o insensato teme e de quem o sábio ri,
Que não fala aos sentidos e que ninguém pode compreender,
Cujo culto selvagem fez derramar entre nós,
Desde sempre, mais sangue que a guerra
Ou a fúria de Témis em mil anos?
Por mais que analise este deifico tratante,
Por mais que o estude, o meu olho filosófico
Não vê neste motivo das vossas religiões
Senão um conjunto impuro de contradições
Que não resiste a um exame sério,
Que podemos insultar, desafiar, ultrajar à vontade.
Fruto do temor, criado pela esperança,
Inconcebível para o nosso espírito,
Tornando-se consoante a mão que o brande
Objecto de terror, de alegria ou de vertigem,
Que o hábil impostor que o anuncia aos humanos
Faz reinar como quer sobre os nossos destinos,
Descrevendo-o ora como mau, ora como bonacheirão,
Ora massacrando-nos ora servindo-nos de pai,
Atribuindo-lhe sempre, segundo as suas paixões,
Os seus costumes, o seu carácter e as suas opiniões,
Quer a mão que perdoa, quer a que nos trespassa.
Ei-lo, esse Deus idiota com que nos engana o padre.
Mas com que direito pretende submeter-me
Ao seu erro aquele que a mentira escraviza?
Necessitarei acaso do Deus de que abjura
A minha razão para aceitar as leis da natureza?
Nela tudo se move, e o seu seio criador
Age continuamente sem a ajuda de um motor.
Que ganharia eu com essa segunda dificuldade?
Demonstrará esse Deus a causa do Universo?
Se cria, foi criado e eis-me de novo incerto
Como antes de recorrer a ele.
Foge, foge para longe, impostura infernal;
Cede, desaparecendo, às leis da natureza:
Ela faz tudo por si própria, tu não passas do vazio
Onde a sua mão nos foi buscar quando nos criou.
Some-te pois, execrável quimera!
Foge para longe, abandona a terra,
Onde não encontrarás senão corações empedernidos
Pela algaraviada mentirosa dos teus míseros amigos!
Quanto a mim, confesso, o ódio que te tenho
É ao mesmo tempo tão certo, tão grande e tão forte
Que seria com prazer, Deus vil, e sem pressas,
Que me masturbaria sobre a tua divindade,
Ou enrabar-te-ia, se a tua frágil existência
Pudesse oferecer um cu à minha incontinência.
Depois arrancar-te-ia com força o coração
Para melhor te compenetrares do meu profundo horror.
Mas seria em vão que se procuraria atingir-te,
A tua essência escapa a quem a quer coagir.
Não podendo esmagar-te, pelo menos entre os mortais,
Gostaria de destruir os teus perigosos altares
E demonstrar àqueles que um Deus ainda cativa
Que esse aborto covarde que a sua fraqueza adora
Não pode pôr termo às paixões.
Ó sagrados movimentos, orgulhosas impressões,
Sede pra sempre objecto das nossas homenagens
As únicas dignas do culto dos verdadeiros sábios,
As únicas que sempre deleitaram os nossos corações
As únicas que a natureza proporciona à nossa felicidade
Cedamos à sua autoridade, e que a sua violência
Subjugando os nossos espíritos sem resistência
Faça dos nossos prazeres leis, impunemente:
O que a sua voz prescreve são os nossos desejos,
Seja qual for a desordem para que nos arraste,
Devemos ceder-lhes sem remorsos e sem dificuldade
E, sem consultar as nossas leis ou costumes,
Entregarmo-nos com ardor a todos os erros
Que pela sua mão a natureza sempre nos ditou.
Nunca respeitemos senão o seu divino murmúrio;
O que em todos os países as nossas leis vãs punem
Foi sempre o que melhor serviu os seu desígnios.
O que parece ao homem uma cruel injustiça,
Não passa do efeito da sua mão corrupta sobre nós,
E quando, por força do hábito, tememos vacilar
Só conseguimos acolhê-la ainda melhor.
Essas doces acções a que chamais crimes,
Esses excessos que os parvos julgam ilegítimos,
São apenas os desvios que lhe agradam,
Os vícios, as tendências que mais aprecia;
O que ela grava em nós é sempre sublime,
Aconselhando o horror, ela designa a vítima:
Golpeêmo-la sem temor e não receemos
Ter cometido uma perversidade, cedendo.
Examinemos o raio nas suas mãos sanguinárias;
Ele fulmina ao acaso, os filhos, os pais,
Os templos, os bordéis, os beatos, os bandidos,
Tudo serve à natureza: precisa de delitos.
Do mesmo modo a servimos ao cometer um crime:
Quanto mais o propagamos, mais ela o adora.
Usemos os direitos poderosos que exerce sobre nós
Entregando-nos sem fim aos gostos mais monstruosos:
Nenhum é proibido pelas suas leis homicidas,
E o incesto, a violação, o roubo, os parricídios,
Os prazeres de Sodoma, os jogos de Safo,
Tudo o que faz mal ao homem ou o mata
É, podeis crer, um meio de lhe agradar.
Destronando os deuses, roubemo-lhes o trovão.
E com esse raio faiscante destruamos tudo
O que nos desagrada neste mundo assustador.
Sobretudo não poupemos nada; que as suas próprias
Atrocidades sirvam de exemplo às nossas piores proezas
Não há nada sagrado: tudo neste universo
Se deve vergar perante os nossos fogosos caprichos.
Quanto mais multiplicarmos, diversificarmos a infâmia,
Mais a sentiremos fortalecida nas nossas almas,
Duplicando, encorajando as nossas cínicas experiências
Conduzindo-nos, dia a dia, passo a passo, à malvadez.
Após os melhores anos, se a sua voz volta a chamar-nos
Regressemos a ela fazendo pouco dos deuses,
O seu cadinho espera-nos para nos recompensar;
O que o seu poder nos tirou, a sua necessidade devolve-nos,
Nela tudo se reproduz, tudo se regenera:
Dos grandes como dos pequenos a puta é a mãe
E aos seus olhos somos todos queridos,
Monstros e malvados ou bons e virtuosos.
 



(Marquês de Sade)  


(A VERDADE, poema em versos alexandrinos, em rima emparelhada, foi escrita em 1787.) 







A VERDADE

Mas que quimera é esta, estéril e impotente,
Que divindade é esta imposta à néscia gente
Por sacerdotes vis, cambada de impostores?
Quererão eles contar-me entre os seus seguidores?

Ah, jamais, juro-o, e não faltarei ao já dito,
Jamais ídolo tão repelente e esquisito
Esse que do delírio é filho e da irrisão
A mim me causará a mais leve impressão.

Eu, glorioso e feliz com o meu epicurismo,
Só pretendo expirar no seio do ateísmo
E que o infame Deus feito para me alarmar
Seja ideado por mim tão só para o blasfemar.

Minha alma te detesta, oh sim, vã ilusão,
E protesto-o aqui, pra tua convicção.
Quisera que existir pudesses por um momento
Pra gozar o prazer de insultar-te a contento.

De facto ele quem é, esse fantasma odioso,
Esse poltrão de Deus, esse ser horroroso
Que nada oferece ou mostra ao espírito e ao olhar,
Que faz tremer o parvo e o que é sábio zombar,

Que aos sentidos não fala e nem o entende alguém,
Cujo culto cruel mais sangue sempre tem
Feito correr que a guerra ou que Témis feroz
Em mil anos verter fizeram entre nós?

Deífico tratante, em vão eu o analiso
Com filósofo olhar, em vão o estudo e viso:
Não vejo no motor de tais religiões
Mais que um impuro nó de mil contradições,

Que cede e se desfaz mal a gente o encara,
O insulta à vontade, o ultraja, o declara
Gerado pelo temor e da esperança nascido,
Que o meu esp’rito jamais teria concebido;

Em alternância ele é, nas mãos dos que o erigem,
Objecto de terror, de alegria ou vertigem,
Que o astuto impostor que no-lo vem pregar
Faz sobre a vida humana a seu prazer reinar,

Que ora ruim o pinta, ora em bondade infindo,
Ora nos massacrando, ora de pai servindo,
Sempre lhe atribuindo, a mando das paixões,
Costumes como os seus, suas opiniões;

Ou a mão que perdoa ou a que nos entala,
Com este Deus idiota o padre nos embala.
Com que direito aquele que a mentira adstringe
Pretende submeter-me ao erro que o atinge?

Careço eu do Deus que a sábia mente abjura
Pra a mim mesmo explicar as leis da mãe natura?
Nela tudo se move, e o seu seio criador
Age sem precisar da ajuda dum motor.

Este duplo embaraço algo me dá a ganhar?
A causa do universo esse Deus vem mostrar?
Se cria, também é criado, e assim fico,
Em recorrer a ele como antes interdito.

Sai do meu seio, sai, infernal impostura,
Desaparecendo cede às leis da mãe natura:
Ela só tudo fez, tu és o nada hiante
Do qual, ao nos criar, sua mão nos pôs distante.

Desvanece-te, pois, execrável quimera!
Pra longes climas foge, abandona esta terra
Onde mais não verás que corações fechados
Ao patoá intrujão dos teus apaniguados!

Quanto a mim, reconheço, é tal e é tamanho,
Tão justo, grande e forte este horror que te tenho,
Que com prazer, Deus vil, e com tranqüilidade
Que digo eu? com enlevo e voluptuosidade,

Teu carrasco era eu se tua fraca existência
Oferecesse algum ponto à vingança, à violência,
E feliz o meu braço ia ao teu coração
Comprovar o rigor desta minha aversão.

Mas é trabalho vão pretender-te atingir,
A tua essência escapa ao que a quer coagir.
Não podendo esmagar-te, ao menos, entre os vivos,
Queria eu derrubar os teus altares nocivos

E mostrar aos que um Deus cativa inda por ora
Que esse aborto tão vil que sua fraqueza adora
Não é feito pra pôr algum termo às paixões.
Ó ímpeto sagrado, altivas impressões,

Sempre, sempre por nós sede homenageados:
Vós só podeis auferir o culto dos mais sábios,
Vós só seu coração constantes deleitar,
Dados pela natureza, vós só nos alegrar!

Ceda-se ao seu poder e que a sua violência,
Subjugando nossa alma alheia à resistência,
Nossos prazeres transforme em leis impunemente:
Basta ao nosso desejo o que a sua voz expende.

Por mais que à agitação seu órgão nos arraste
Há que ceder-lhes sem remorso e sem desgaste;
E, não escrutando leis nem costumes lembrando,
Ardentemente ao erro irmo-nos entregando,

Que sempre por suas mãos no-lo ditou natura.
Respeitemos tão só o que ela nos murmura;
O que a nossa lei vã fustiga em toda a terra
É, pra o que ela planeia, o que mais preço encerra.

O que ao homem parece uma injustiça atroz
Efeito da sua mão corruptora é em nós,
E quando – hábito nosso – ir errar receamos,
Acolhê-la melhor é o que enfim lucramos.

Essas doces acções a que vós chamais crime
Esses excessos que só o parvo ilegitima
São os desvios que mais lhe agradam ao olhar
Vícios, inclinações que a fazem deleitar;

O que ela grava em nós não é senão sublime;
Aconselhando o horror, oferece quem vitima.
É feri-la então sem medo e sem temor talvez
De ter, em lhe cedendo, obrado malvadez.

Vejamos como o raio em suas mãos fatais
Fulmina ao acaso e como os filhos e os pais,
Os templos, os bordéis, os crentes, os bandidos,
Tudo à natura apraz, carente de delitos.

Servimo-la nós também ao cometer o crime:
Mais nossa mão o espalha e mais aquela o estima.
Usemos do seu grande império sobre nós,
Entregando-nos sempre ao prazer mais atroz:

Defesas nunca são suas leis homicidas
E a violação, o incesto, o roubo, os parricídios,
Os gostos de Sodoma e o que Safo aprova,
O que ao homem faz mal ou o que o leva à cova

Tudo por certo é meio de lhe agradar.
Por terra os deuses pôr, o seu raio roubar
E destruir com ele, o dardo faiscante,
Tudo o que nos despraz num mundo horripilante.

Nada se poupe então: que as suas malvadezas
Sirvam de exemplo em tudo às nossas más proezas.
Sagrado, nada há: tudo neste universo
Deve ao jugo vergar do nosso vivo acesso.

Quanto mais aumentar, variar a perfídia,
Melhor a sentirá nossa alma decidida:
Dobrando, encorajando as nossas tentativas,
Leva-nos passo a passo às acções mais nocivas.

Os belos anos vão-se, ela chama por nós;
Dos deuses escarnecendo, ouçamos sua voz:
Pra nos recompensar, seu crisol espera já;
O que o poder tomou, necessidade dá.

Tudo ali se restaura e reproduz também.
Do grande e do pequeno a puta será mãe,
E todos vêem iguais seu olhar amoroso,
O monstro e o celerado, o bom e o virtuoso.