quinta-feira, 21 de junho de 2012

EDUARDO GALEANO



Eduardo Hughes Galeano, mais conhecido como Eduardo Galeano, jornalista e escritor uruguaio, nasceu na cidade de Montevidéu, no dia 3 de setembro de 1940. Ele atuou como chefe de redação do periódico Marcha e também dirigiu o veículo Época, trabalhos realizados em sua cidade de origem. Neste período ele igualmente instituiu e administrou a revista Crisis, desta vez em Buenos Aires.
Exilado na Argentina e na Espanha entre 1973 e 1985, retornou ao Uruguai neste ano, fixando residência em Montevidéu. Autor de inúmeras obras literárias e jornalísticas, traduzidas em mais de vinte idiomas, ele exercita seu estilo literário compondo pequenas histórias que abordam desde temas políticos significativos no contexto histórico da América Latina até uma temática singela, enfocando fatos do dia-a-dia e até mesmo o futebol. Neste sentido, ele é considerado um escritor da estirpe de John dos Passos e Gabriel García Márquez.
Um de seus livros mais célebres e importantes é As Veias Abertas da América Latina, obra na qual narra em uma linguagem poética e arrebatadora, com intensidade ímpar, a terrível exploração que atingiu duramente os países latino-americanos, a qual provocou a extinção de vários povos, o extermínio de inúmeros habitantes da América Latina, deixando dolorosas cicatrizes e seqüelas que rasgam de ponta a ponta a região latino-americana.
Sua obra tem sido amplamente reconhecida e premiada. Nos anos de 1975 e 1978 ele conquistou o prêmio Casa de Las Américas; recebeu o Aloa, oferecido pelas editoras da Dinamarca, em 1993; sua trilogia Memória do Fogo foi condecorada pelo Ministério da Cultura do Uruguai; foi agraciado também com o American Book Award, pela Washington University, dos Estados Unidos, em 1989.
Posteriormente, em 1999, Eduardo Galeano tornou-se o primeiro escritor a receber um prêmio doado a quem contribuísse para a Liberdade Cultural, da parte da Lannan Foundation, do Novo México. Ele também foi homenageado com o título de primeiro cidadão ilustre do Mercosul. Em 2001, no mês de Dezembro, ele recebeu o título de Doutor Honoris Causa, concedido pelaUniversidade de Havana, de Cuba.
Algumas de suas principais obras são: De pernas pro ar, Dias e noites de amor e de guerra, Futebol ao sol e à sombra, O livro dos abraços, Memória do fogo (que inclui Os nascimentos, As caras e as máscaras e O século do vento), Mulheres, As palavras andantes, Vagamundo (todos publicados pela L&PM Editores) e As veias abertas da América Latina (lançado pela Editora Paz e Terra).
Fontes
http://pt.wikipedia.org/wiki/Eduardo_Galeano
http://html.editorial-caminho.pt
Por Ana Lucia Santana



Somos o que fazemos, mas somos, principalmente, o que fazemos para mudar o que somos.







Neste livro, Galeano parte de Alice, a personagem de Lewis Carrol, para mostrar que as coisas não vão bem no nosso mundo.
Há 130 anos, depois de visitar o País das Maravilhas, Alice entrou num espelho para descobrir o mundo ao avesso. Se Alice renascesse em nossos dias, não precisaria atravessar nenhum espelho: bastaria que chegasse à janela.
E se tudo está do avesso, o autor destrincha o quanto a partir de fatos e de eventos históricos e jornalísticos. Na escola do mundo ao avesso que todos reconhecemos, os alunos frequentam cursos básicos de injustiça, de racismo e machismo, assistem a cátedras de medo, seminários de ética, aulas magistrais de impunidade, são formados na pedagogia da solidão e diplomam-se na contraescola. Tão verdadeiro e emotivo quanto cruel.







O MEDO GLOBAL

Os que trabalham têm medo de perder o trabalho, os que não trabalham têm medo de nunca encontrar o trabalho.
Quem não tem medo da fome tem medo da comida.
Os automobilistas têm medo de caminhar e os pedestres têm medo de ser atropelados.
A democracia tem medo de recordar e a linguagem tem medo de dizer.
Os civis têm medo dos militares e os militares têm medo da falta de armas.
As armas têm medo da falta de guerras.
Medo da mulher à violência do homem, medo do homem das mulheres sem medo.
Medo dos ladrões, medo da polícia.
Medo da porta sem fechadura, do tempo sem relógio, das crianças sem televisão.
Medo da noite sem comprimidos para dormir, medo de dia sem comprimidos para acordar.
Medo da multidão, medo da solidão.
Medo do que foi e do que pode ser.
Medo de morrer, medo de viver.



















As perdas das coisas, confesso que nunca me importaram muito. Mas as perdas das pessoas sim, doeram e, em alguns casos, deixaram um buraquinho bem difícil de preencher. Mas este mundo está armado assim, é um tecido de encontros e desencontros, de perdas e ganhos, e o melhor dos meus dias é o que ainda não vivi. E cada perda corresponde a um encontro que ainda não tive e, por sorte, a realidade é generosa e não falha nisso. Na verdade, eu escrevo para celebrá-la e a celebrando, denuncio tudo que impede que a gente reconheça nos outros e em nós mesmos, as múltiplas cores do arco-íris terrestre. Somos muitíssimo mais do que nos dizem que somos!“


O corpo não é uma máquina como nos diz a ciência. Nem uma culpa como nos fez crer a religião. O corpo é uma festa.


A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.




“As pulgas sonham em comprar um cão, e os ninguéns com deixar a pobreza, que em algum dia mágico de sorte chova a boa sorte a cântaros; mas a boa sorte não chova ontem, nem hoje, nem amanhã, nem nunca, nem uma chuvinha cai do céu da boa sorte, por mais que os ninguéns a chamem e mesmo que a mão esquerda coce, ou se levantem com o pé direito, ou comecem o ano mudando de vassoura.

Os ninguéns: os filhos de ninguém, os dono de nada.
Os ninguéns: os nenhuns, correndo soltos, morrendo a vida, fodidos e mal pagos:
Que não são embora sejam.
Que não falam idiomas, falam dialetos.
Que não praticam religiões, praticam superstições.
Que não fazem arte, fazem artesanato.
Que não são seres humanos, são recursos humanos.
Que não tem cultura, têm folclore.
Que não têm cara, têm braços.
Que não têm nome, têm número.
Que não aparecem na história universal, aparecem nas páginas policiais da imprensa local.
Os ninguéns, que custam menos do que a bala que os mata.”









O mundo
Um homem da aldeia de Negu・ no litoral da Colômbia, conseguiu subir aos céus. Quando voltou, contou. Disse que tinha contemplado, lá do alto, a vida
humana. E disse que somos um mar de fogueirinhas.
— O mundo é isso — revelou — Um montão de gente, um mar de
fogueirinhas.
Cada pessoa brilha com luz própria entre todas as outras. Não existem duas fogueiras iguais. Existem fogueiras grandes e fogueiras pequenas e fogueiras
de todas as cores. Existe gente de fogo sereno, que nem percebe o vento, e gente de fogo louco, que enche o ar de chispas. Alguns fogos, fogos bobos, não alumiam nem
queimam; mas outros incendeiam a vida com tamanha vontade que é impossível olhar para eles sem pestanejar, e quem chegar perto pega fogo.





Na luta do bem contra o mal, é sempre o povo que morre.


Quando as palavras não são tão dignas quanto o silêncio, é melhor calar e esperar.








O direito a sonhar


O que acham se delirarmos um pouquinho? 
O que acham se fixamos nossos olhos mais além da infâmia, para imaginarmos outro mundo possível.

Tente adivinhar como será o mundo depois do ano 2000. Temos apenas uma única certeza: se estivermos vivos, teremos virado gente do século passado. Pior ainda, gente do milênio passado.

Sonhar não faz parte dos trinta direitos humanos que as Nações Unidas proclamaram no final de 1948. Mas, se não fosse por causa do direito de sonhar e pela água que dele jorra, a maior parte dos direitos morreria de sede. Deliremos, pois, por um instante. O mundo, que hoje está de pernas para o ar, vai ter de novo os pés no chão.

Nas ruas e avenidas, carros vão ser atropelados por cachorros.

O ar será puro, sem o veneno dos canos de descarga, e vai existir apenas a contaminação que emana dos medos humanos e das humanas paixões.

O povo não será guiado pelos carros, nem programado pelo computador, nem comprado pelo supermercado, nem visto pela TV. A TV vai deixar de ser o mais importante membro da família, para ser tratada como um ferro de passar ou uma máquina de lavar roupas.

Vamos trabalhar para viver, em vez de viver para trabalhar.

Em nenhum país do mundo os jovens vão ser presos por contestar o serviço militar. Serão encarcerados apenas os quiserem se alistar.

Os economistas não chamarão de nível de vida o nível de consumo, nem de qualidade de vida a quantidade de coisas.

Os cozinheiros não vão mais acreditar que as lagostas gostam de ser servidas vivas.

Os historiadores não vão mais acreditar que os países gostem de ser invadidos.

Os políticos não vão mais acreditar que os pobres gostem de encher a barriga de promessas.

O mundo não vai estar mais em guerra contra os pobres, mas contra a pobreza. E a indústria militar não vai ter outra saída senão declarar falência, para sempre.

Ninguém vai morrer de fome, porque não haverá ninguém morrendo de indigestão.

Os meninos de rua não vão ser tratados como se fossem lixo, porque não vão existir meninos de rua. Os meninos ricos não vão ser tratados como se fossem dinheiro, porque não vão existir meninos ricos.

A educação não vai ser um privilégio de quem pode pagar por ela.

A polícia não vai ser a maldição de quem não pode comprá-la.

Justiça e liberdade, gêmeas siamesas condenadas a viver separadas, vão estar de novo unidas, bem juntinhas, ombro a ombro.

Uma mulher - negra - vai ser presidente do Brasil, e outra - negra - vai ser presidente dos Estados Unidos. Uma mulher indígena vai governar a Guatemala e outra, o Peru.

Na Argentina, as loucas da Praça de Maio vão virar exemplo de sanidade mental, porque se negaram a esquecer, em tempos de amnésia obrigatória.

A Santa Madre Igreja vai corrigir alguns erros das Tábuas de Moisés. O sexto mandamento vai ordenar: "Festejarás o corpo". E o nono, que desconfia do desejo, vai declará-lo sacro. 

A Igreja vai ditar ainda um décimo-primeiro mandamento, do qual o Senhor se esqueceu: "Amarás a natureza, da qual fazes parte". Todos os penitentes vão virar celebrantes, e não vai haver noite que não seja vivida como se fosse a última, nem dia que não seja vivido como se fosse o primeiro.

Ler mais: http://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=207096#ixzz1yM5o1JGf
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"A memória guardará o que valer a pena. A memória sabe de mim mais que eu; e ela não perde o que merece ser salvo."




Há aqueles que crêem que o destino descansa nos joelhos dos deuses, mas a verdade é que trabalha, como um desafio candente, sobre as consciências dos homens.




...De Cuba em diante, outros países também iniciaram por distintas vias e distintos meios a experiência de mudança: a perpetuação da atual ordem de coisas é a perpetuação do crime.
Os fantasmas de todas as revoluções estranguladas ou traídas, ao longo da torturada história latino-americana, ressurgem nas novas experiências, assim como os tempos presentes tinham sido pressentidos e engendrados pelas contradições do passado. A história é um profeta com o olhar voltado para trás: pelo que foi, e contra o que foi, anuncia o que será...





Na parede de um botequim de Madri, um cartaz avisa: Proibido cantar. Na parede do aeroporto do Rio de Janeiro, um aviso informa: É proibido brincar com os carrinhos porta-bagagem. Ou seja: Ainda existe gente que canta, ainda existe gente que brinca.


"Assovia o vento dentro de mim.
Estou despido. Dono de nada, dono de ninguém, nem mesmo dono de minhas certezas, sou minha cara contra o vento, a contravento, e sou o vento que bate em minha cara."



Não importa de onde vim, mais sim aonde quero chegar




Somos porque ganhamos. Se perdemos, deixamos de ser.




A primeira condição para modificar a realidade consiste em conhece-la.




Nossa derrota esteve sempre implícita na vitória dos outros. Nossa riqueza sempre gerou nossa pobreza por nutrir a prosperidade alheia: os impérios e seus beleguins nativos.




Na alquimia colonial e neocolonial o ouro se transfigura em sucata, os alimentos em veneno.




Em certo sentido, a direita tem razão quando se identifica com a tranquilidade e com a ordem. A ordem é a diuturna humilhação das maiorias, mas sempre é uma ordem - a tranquilidade de que a injustiça siga sendo injusta e a fome faminta.













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